Da infância à idade adulta, vamos
alterando a nossa forma de perceber o mundo, suprimindo, pouco a pouco, as
formas imaginativas tão comuns de nossos primeiros anos, transformando-as em
outras tantas desvestidas de quaisquer quimeras.
Mas os enigmas que povoam nossos
delírios infantis jamais nos abandonam: como profundos icebergs que se deixam aflorar
vez por outra, permitem ao adulto retroalimentá-los com situações experimentadas
mais recentemente, para que possam exprimir novos sentidos no momento presente –
tal como o faz o poeta indiano Dom Moraes no soneto a seguir.
J.A.R. – H.C.
Dom Moraes
(1938-2004)
Architecture
The architecture of
an aunt
Made the child dream
of cupolas,
Domes, other smoothly
rounded shapes.
Geometries troubled
his sleep.
The architecture of
young women
Mildly obsessed the
young man:
Its globosity,
firmness, texture,
Lace cobwebs for
adornment and support.
Miles from his aunt,
the old child
Watched domes and
cupolas defaced
In a hundred
countries, as time passed.
A thousand kilometres
of lace defiled,
And much gleaming and
perfect architecture
Flaming in the fields
with no visible support.
Telhados de Florença
(Jonelle Summerfield:
pintora norte-americana)
Arquitetura
A arquitetura de uma
tia
Fez com que a criança
sonhasse com cúpulas,
Domos, outras formas tenuemente
arredondadas.
As geometrias perturbavam
o seu sono.
A arquitetura das mulheres
jovens
Obsedou suavemente o jovem:
Sua globosidade,
firmeza, textura,
Renda teia de aranha
como adorno e apoio.
A milhas de sua tia,
a velha criança
Divisou cúpulas e domos
desfigurados
Numa centena de
países, com o passar do tempo.
A mil quilômetros da
renda maculada,
Um intenso brilho e perfeita
arquitetura
A flamejar nos campos,
sem apoio visível.
Referência:
MORAES, Dom. Architecture. In: BENSON,
Gerard; CHERNAIK, Judith; HERBERT, Cicely (Eds.). Best poems on the
underground. 1st. publ. London, EN: Weidenfeld & Nicolson, 2009. p. 198.
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