O poeta, estando em Paris, contemplou o
céu e se lembrou de Antofagasta, cidade ao norte do Chile natal. E mais: com
sua prodigiosa imaginação, concebeu as estrelas como os olhos espreitantes de
um gato ou duas centelhas no tigre, lídimas palpitações divinas.
Como se nota, o trânsito do poeta por
Antofagasta não se parece com um deslocamento físico até os logradouros da cidade,
senão a regiões não mapeadas pela cartografia, ou mais bem, aos seus próprios estados
mentais – muito embora as referências transitem pela história e pelos recursos
da região.
J.A.R. – H.C.
Pablo Neruda
(1904-1973)
Gatos Nocturnos
Cuántas estrellas
tiene un gato
me preguntaron en
Paris
y comencé tigre por
tigre
a acechar Ias
constelaciones:
porque dos ojos
acechantes
son palpitaciones de
Dios
en los ojos frios del
gato
y dos centellas en el
tigre.
Pero es una estrella
Ia cola
de un gato erizado en
el cielo
y es un tigre de
piedra azul
Ia noche azul de
Antofagasta.
La noche gris de
Antofagasta
se eleva sobre Ias
esquinas
como una derrota
elevada
sobre Ia fatiga
terrestre
y se sabe que es el
desierto
el otro rostro de Ia
noche
tan infinita,
inexplorada
como el no ser de Ias
estrellas.
Y entre Ias dos copas
del alma
los minerales
centellean.
Nunca vi un gato en el
desierto:
La verdade es que
nunca tuve
para dormir más compañia
que Ias arenas de Ia
noche,
Ias circunstancias del
desierto
o Ias estrellas del
espacio.
Porque así no son y así
son
mis pobres
averiguaciones.
Noturno em ouro e
negro:
o rojão que se
precipita
(James M. Whistler:
pintor norte-americano)
Gatos Noturnos
Quantas estrelas tem
um gato
me perguntaram em
Paris
e comecei tigre por
tigre
a espreitar as
constelações:
porque dois olhos
espreitantes
são palpitações de
Deus
nos olhos frios do
gato
e duas centelhas no
tigre.
Mas é uma estrela a
cauda
de um gato eriçado no
céu
e é um tigre de pedra
azul
a noite azul de
Antofagasta.
A noite gris de
Antofagasta
se eleva sobre as
esquinas
como uma derrota
elevada
sobre a fadiga
terrestre
e sabe-se que é o
deserto
o outro rosto da
noite
tão infinita,
inexplorada
como o não ser das
estrelas.
E entre as duas taças
da alma
cintilam os minerais.
Nunca vi um gato no
deserto:
a verdade é que nunca
tive
para dormir mais
companhia
que as areias da noite,
as circunstâncias do
deserto
ou as estrelas do
espaço.
Porque assim não são
e assim são
minhas pobres
averiguações.
Referência:
NERUDA, Pablo. Gatos nocturnos / Gatos
Noturnos. Tradução de Olga Savary. In: __________. O coração amarelo.
Tradução de Olga Savary. Edição bilíngue. Porto Alegre, RS: L&PM, 2004. Em
espanhol: p. 50 e 52; em português: p. 51 e 53. (Coleção ‘L&PM Pocket’; v.
359)
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