O poeta confronta o silêncio da morte, desnorteado
pela ausência das coisas transcendentes em sua vida, num ponto do binômio
espaço-tempo em que só restam escassos fanais de luz, estando tudo o mais
coberto pelo silêncio e pela opacidade.
Procura ele agora, avidamente, o
pequeno crucifixo de prata que, outrora, alguém lhe dera, adjetivando-o como “milagroso”,
ante o “terrível silêncio do Cosmos”. Esse silêncio que representa o fim de sua
própria entidade, além da qual Quintana não lança quaisquer conjecturas
existenciais.
J.A.R. – H.C.
Mario Quintana
(1906-1994)
No silêncio terrível
No silêncio terrível
do Cosmos
Há de ficar uma
última lâmpada acesa.
Mas tão baça
Tão pobre
Que eu procurarei, às
cegas, por entre os papéis revoltos,
Pelo fundo dos
armários,
Pelo assoalho, onde
estarão fugindo imundas ratazanas,
O pequeno crucifixo
de prata
– O pequenino, o
milagroso crucifixo de prata que
tu me deste um dia
Preso a uma fita
preta.
E por ele os meus
lábios convulsos chorarão
Viciosos do divino
contato da prata fria...
Da prata clara,
silenciosa, divinamente fria – morta!
E então a derradeira
luz se apagará de todo...
Sob um sol diferente
(Tyler Young: artista
norte-americano)
Referência:
QUINTANA, Mario. No silêncio terrível.
In: __________. O aprendiz de feiticeiro. 2. reimpressão. São Paulo, SP:
Globo, 2005. p. 49. (Coleção Mario Quintana / organização, plano de edição,
fixação de texto, cronologia e bibliografia de Tania Franco Carvalhal)
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