Tudo o que importava para Pound era a
beleza. Ainda que saibamos que haveremos de morrer um dia, devemos zelar pela
beleza da grande arte, ela que é como uma rosa selada em âmbar, preservada para
sempre.
Percebamos que o poeta grafa a palavra
beleza com a letra “B” assim, maiúscula, para sublinhar a transcendência da
beleza artística, demarcando desse modo a reserva de seu poema em relação à
balada romântica “Go, lovely Rose”, de Edmund Waller, seja como réplica seja
como simples paródia.
J.A.R. – H.C.
Ezra Pound
(1885-1972)
Envoi* (1919)
Go, dumb-born book,
Tell her that sang me
once that song of Lawes:
Hadst thou but song
As thou hast subjects
known,
Then were there cause
in thee that should condone
Even my faults that
heavy upon me lie
And build her glories
their longevity.
Tell her that sheds
Such treasure in the
air,
Recking naught else
but that her graces give
Life to the moment,
I would bid them live
As roses might, in
magic amber laid,
Red overwrought with
orange and all made
One substance and one
colour
Braving time.
Tell her that goes
With song upon her
lips
But sings not out the
song, nor knows
The maker of it, some
other mouth,
May be as fair as
hers,
Might, in new ages,
gain her worshippers,
When our two dusts
with Waller’s shall be laid,
Siftings on siftings
in oblivion,
Till change hath
broken down
All things save
Beauty alone.
Orquídea da Selva
(Carol Cavalaris:
pintora norte-americana)
Envoi (1919)
Vai, livro natimudo,
E diz a ela
Que um dia me cantou
essa canção de Lawes:
Houvesse em nós
Mais canção, menos
temas,
Então se acabariam
minhas penas,
Meus defeitos sanados
em poemas
Para fazê-la eterna
em minha voz.
Diz a ela que espalha
Tais tesouros no ar,
Sem querer nada mais
além de dar
Vida ao momento,
Que eu lhes
ordenaria: vivam,
Quais rosas, no âmbar
mágico, a compor,
Rubribordadas de
ouro, só
Uma substância e cor
Desafiando o tempo.
Diz a ela que vai
Com a canção nos
lábios
Mas não canta a
canção e ignora
Quem a fez, que
talvez uma outra boca
Tão bela quanto a
dela
Em novas eras há de
ter aos pés
Os que a adoram
agora,
Quando os nossos dois
pós
Com o de Waller se
deponham, mudos,
No olvido que refina
a todos nós,
Até que a mutação
apague tudo
Salvo a Beleza, a
sós.
Nota:
* “Envoi” são observações derradeiras,
normalmente de cunho explicativo ou distintivo, apostas ao final de um poema,
ensaio ou livro; mais especificamente, refere-se a uma estrofe curta ao final
de uma balada, de forma a sintetizá-la ou dedicá-la.
Referências:
Em Inglês
POUND, Ezra. Envoi (1919). In: FREER;
Allen; ANDREW, John (Eds.). Book of english verse: 1900-1939. Cambridge,
EN: Cambridge University Press, 1970. p. 96.
Em Português
POUND, Ezra. Envoi (1919). Tradução de
Augusto de Campos. In: __________. Poesia. Traduções de Augusto e
Haroldo de Campos, Décio Pignatari, J. L. Grünewald e Mário Faustino. 3. ed.
São Paulo, SP: Hucitec; Brasília, DF: Edunb; 1993. p. 127.
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