O poeta reconhece que sua poesia não se estabelece por meio de
sobressaltos ou de arroubos de eloquência, senão pela via da discrição e do comedimento,
de forma a cativar o leitor pelo equilíbrio de suas linhas.
Se a quietude for uma tendência de espírito do escritor, refletida em
suas poesias, nos parece algo invulgar que tenha se tornado também diplomata, porquanto
de um representante com tal estirpe, o mínimo que se exige é extroversão e habilidades
com a palavra escrita e falada. Ou será que conjecturamos falsamente?
J.A.R. – H.C.
Ribeiro Couto
(1898-1963)
Surdina
Minha poesia é toda
mansa.
Não gesticulo, não me
exalto...
Meu tormento sem
esperança
tem o pudor de falar
alto.
No entanto, de olhos
sorridentes,
assisto, pela vida em
fora,
à coroação dos eloquentes.
É natural: a voz
sonora
inflama as multidões
contentes.
Eu, porém, sou da
minoria.
Ao ver as multidões
contentes
penso, quase sem
ironia:
“Abençoados os eloquentes
que vos dão toda essa
alegria.”
Para não ferir a
lembrança
minha poesia tem
cuidados...
E assim é tão mansa,
tão mansa,
que pousa em corações
magoados
como um beijo numa
criança.
De: “Poemetos de ternura e de
melancolia” (1924)
Crepúsculo Calmo
(Darrell Bush: pintor
norte-americano)
Referência:
COUTO, Ribeiro. Surdina. In: MILLIET,
Sérgio (Seleção e Notas). Obras-primas
da poesia universal. 3. ed. São Paulo, SP: Livraria Martins Editora, ago.1957.
p. 367.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário