Se Du Bellay vai às alturas para conceber e formular os atributos da
ideia (vide postagem anterior), Augusto dos Anjos rasteja na mais árida
materialidade, presente até mesmo nas alegorias que emprega para circunscrever
o seu domínio de intervenção.
Dos Anjos concebe-a, como se poderia esperar, derivada da psicogenética e
da química do cérebro, constringida no oculto encéfalo, até que, pelo mecanismo
da linguagem, e ejetada por uma força centrípeta, venha a ser apregoada pelo aparelho
fonador. Ou não!: pois como formula o poeta, é possível que a ideia, antes, venha
a ser estancada pelo “mulambo da língua paralítica”.
J.A.R. – H.C.
Augusto dos Anjos
(1884-1914)
A Ideia
De onde ela vem? De
que matéria bruta
Vem essa luz que
sobre as nebulosas
Cai de incógnitas
criptas misteriosas
Como as estalactites
duma gruta?!
Vem da psicogenética
e alta luta
Do feixe de moléculas
nervosas,
Que, em
desintegrações maravilhosas,
Delibera, e depois,
quer e executa!
Vem do encéfalo
absconso que a constringe,
Chega em seguida às
cordas do laringe,
Tísica, tênue,
mínima, raquítica...
Quebra a força
centrípeta que a amarra,
Mas, de repente, e
quase morta, esbarra
No mulambo da língua
paralítica!
Brainstorming
(Adel Al-Abbasi:
artista bareinita)
Referência:
ANJOS, Augusto dos. A ideia. In:
__________. Todos os sonetos. Porto
Alegre, RS: L&PM, 2001. p. 12. (L&PM Pocket, nº 83)
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