Neste poema, desde o seu título, revelam-se os temas do gênero e da homossexualidade:
“chapéus trocados” bem se podem entender como “trocas de papéis sexuais”, com
os mencionados tios e tias a usar peças do sexo oposto – aqueles com chapéus
femininos, estas com bonés de iatistas.
É possível que Bishop recusasse o travestismo, ainda que mantivesse um
relacionamento homoafetivo com a arquiteta carioca Lota Macedo de Soares, por
sinal, história muito bem adaptada ao cinema por Bruno Barreto, em “Flores
Raras”, de 2013, com a atriz australiana Miranda Otto como Bishop e Glória
Pires como Lota.
J.A.R. – H.C.
Elizabeth Bishop
(1911-1979)
Exchanging Hats
Unfunny uncles who insist
in trying on a lady’s hat,
− oh, even if the joke falls flat,
we share your slight transvestite twist
in spite of our embarrassment.
Costume and custom are complex.
The headgear of the other sex
inspires us to experiment.
Anandrous aunts, who, at the beach
with paper plates upon your laps,
keep putting on the yachtsmen’s caps
with exhibitionistic screech,
the visors hanging o’er the ear
so that the golden anchors drag,
− the tides of fashion never lag.
Such caps may not be worn next year.
Or you who don the paper plate
itself, and put some grapes upon it,
or sport the Indian’s feather bonnet,
− perversities may aggravate
the natural madness of the hatter.
And if the opera hats collapse
and crowns grow draughty, then, perhaps,
he thinks what might a miter matter?
Unfunny uncle, you who wore a
hat too big, or one too many,
tell us, can’t you, are there any
stars inside your black fedora?
Aunt exemplary and slim,
with avernal eyes, we wonder
what slow changes they see under
their vast, shady, turned-down brim.
(1956)
In: “Uncollected
Poems” (1983)
Mulher na Praia
(Gunter Kreil: pintor
alemão)
Chapéus Trocados
Tio desengraçado, a
quem deu na veneta
meter na cabeça um
chapéu de mulher,
embora sem graça, dá
sempre prazer
o seu travestismo
discreto e zureta,
que até nos
constrange, e causa impaciência.
Pois não se discute
costume, nem gosto.
Por isso é que as
roupas do sexo oposto
inspiram essa espécie
de experiência.
Ó tia anândrica, que
lá na praia
resolve provar um
boné de iatista
e dá um grito agudo,
exibicionista,
até que os olhares de
todos atraia,
a aba até o brinco –
aproveite bem,
que a moda e as marés
estão sempre mudando,
e esse boné que você
está ostentando
talvez não se use no
ano que vem.
E a quem parecer
engraçado um cocar,
ou prato de uvas
bancando sombreiro,
é recomendável que
pense primeiro
que tais perversões
podem bem agravar
loucuras que haja do
lado de dentro.
E quando por fim
desmorona a cartola,
expondo aos ventos
mais frios a cachola,
que tal um barrete
vermelho no centro?
Tio desengraçado, no
seu chapéu-coco
maior que a cabeça,
ou nos dois que você
pôs um sobre o outro,
o que é que se vê?
Há estrelas, talvez,
nesse seu domo oco?
Ó tia exemplar, com
suas formas esguias,
seus olhos avernos e
desassombrados
que lentas mudanças
verão, ocultados
sob abas enormes,
pesadas, sombrias?
(1956)
Em: “Poemas Dispersos” (1983)
Referência:
BISHOP, Elizabeth. Exchanging hats / Chapéus trocados.
Tradução de Paulo Henriques Britto. In: __________. Poemas escolhidos de Elizabeth Bishop. Seleção, tradução e textos introdutórios de
Paulo Henriques Britto. 1. ed. Edição bilíngue. São Paulo, SP: Companhia das
Letras, 2012. Em inglês: p. 390 e 392; em português: p. 391 e 393.
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