Renomado artista surrealista russo-francês de origem judaica, Chagall
viveu o dilema do exílio, a se refletir nos caracteres de suas pinturas, nas
quais figuras humanas raramente firmam os pés no solo, possivelmente a aludir a
esse estado de seminomadismo e instabilidade que deixa tudo em suspenso.
Tudo são memórias e lembranças passadas no íntimo do pintor-poeta, estas
sim com todo o potencial para serem levadas aonde quer que o ser humano se
desloque, decerto um ancoradouro ímpar para os voos de imaginação, tão
necessários ao mecanismo da criação artística.
J.A.R. – H.C.
Marc Chagall
(1887-1985)
Seul est mien le pays qui se trouve
dans mon âme
Seul est mien
Le pays qui se trouve
dans mon âme
J’y entre sans passeport
Comme chez moi
Il voit ma tristesse
Et ma solitude
Il m’endort
Et me couvre d’une pierre parfumée
En moi fleurissent
des jardins
Mes fleurs sont inventées
Les rues m’appartiennent
Mais il n’y a pas de maisons
Elles ont été détruites dès l’enfance
Les habitants vagabondent dans l’air
A la recherche d’un
logis
Ils habitent mon âme
Voilà pourquoi je
souris
Quand mon soleil
brille à peine
Ou je pleure
Comme une légère pluie dans la nuit
Il fut un temps où j’avais deux têtes
Il fut un temps où ces deux visages
Se couvraient d’une rosée amoureuse
Et fondaient comme le parfum d’une rose
A présent il me
semble
Que même quand je
recule
Je vais en avant
Vers un haut portail
Derrière lequel s’étendent des murs
Où dorment des tonnerres éteints
Et des éclairs brisés
Seul est mien
Le pays qui se trouve
dans mon âme
Eu e a Aldeia
(Marc Chagall)
Só é meu o país que trago dentro da
alma
Só é meu
O país que trago
dentro da alma.
Entro nele sem
passaporte
Como em minha casa.
Ele vê a minha
tristeza
E a minha solidão.
Me acalanta.
Me cobre com uma
pedra perfumada.
Dentro de mim
florescem jardins.
Minhas flores são
inventadas.
As ruas me pertencem
Mas não há casas nas
ruas.
As casas foram
destruídas desde a minha infância.
Os seus habitantes
vagueiam no espaço
À procura de um lar.
Instalam-se em minha
alma.
Eis porque sorrio
Quando mal brilha o
meu sol.
Ou choro
Como uma chuva leve na
noite.
Houve tempo em que eu
tinha duas cabeças.
Houve tempo em que
essas duas caras
Se cobriam de um
orvalho amoroso.
Se fundiam como o
perfume de uma rosa.
Hoje em dia me parece
Que até quando recuo
Estou avançando para
uma alta portada
Atrás da qual se
estendem muralhas
Onde dormem trovões
extintos
E relâmpagos
partidos.
Só é meu
O mundo que trago
dentro da alma.
Referências:
Em Francês
CHAGALL, Marc. Seul est mien le pays
qui se trouve dans mon âme. In: __________. Poèmes. Genève, CH: Cramer Editeur, 1975. p. 129.
Em Português
CHAGALL, Marc. Só é meu o país que
trago dentro da alma. Tradução de Manuel Bandeira. In: BANDEIRA, Manuel. Antologia poética. 6. ed. Rio de
Janeiro, GB: Sabiá, 1961. p. 212.
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