Há quem se entristeça na época mais bonita do ano. Alguns pela excessiva
comercialização do Natal. Outros porque o Natal parece ser um gatilho para
envolver-se em imoderada autorreflexão e ruminação sobre as insuficiências da
vida. Outros, ainda, temem o Natal em razão das expectativas de reuniões com a
família, amigos e conhecidos, com os quais preferem não passar o tempo.
E não basta acercar-se das crianças para a alegria voltar. Esse é o mote
deixado pelo poeta, que não compartilha da forma simples, ingênua e maravilhada
com que os pirralhos experimentam cada momento, embora não se recuse a
distribuir-lhes alegrias que não são propriamente suas.
J.A.R. – H.C.
Raul de Leoni
(1895-1926)
Árvore de Natal
Tarde! Estou muito
triste, triste, assim
De uma tristeza
imóvel e varia...
E uma ronda de
crianças esfuzia
Na aquarela chinesa
do jardim...
Aos poucos a
farândola leviana,
Chega-se a mim,
cerca-me ousadamente:
Inquietas larvazinhas
de alma humana,
Misteriosos destinos
em semente
Vêm parar a meus pés
depois – meigas violetas,
Sob a sombra de uma
árvore doente.
Não tenho nada para
dar-lhes, sou
Como um pinheiro
contemplativo,
Cujos ramos dolentes
não têm frutos
Que há muito um vento
cruel os arrancou...
Mas elas pedem
qualquer cousa e eu me comovo.
Eu tenho tanta pena
das crianças!
Elas são todo o mundo
a começar de novo
Para as mesmas incertas
caminhadas,
Para o mistério das
encruzilhadas;
São toda a Humanidade
que renasce,
Ingênua, simples e
maravilhada,
Como a primeira vez
que apareceu.
E, então (isso é dos
santos e dos sábios),
Penduro na tristeza
dos meus lábios
Cousas alegres que
não são minhas:
Fábulas mansas,
contos de fadas,
Histórias de anjos e
rainhas
E uma porção de
cousas encantadas,
Que vou distribuindo
pelo bando...
E à tarde que se vai
lentamente apagando,
Na aquarela chinesa
do jardim,
Semeando alegrias e
esperanças –
Minha tristeza é
assim uma piedosa e linda
Árvore de Natal entre
as crianças...
Feliz Natal
(Viggo Johansen:
pintor dinamarquês)
Referência:
LEONI, Raul de. Árvore de Natal. In: RAMOS,
Péricles Eugênio da Silva (Introdução, seleção e notas). Poesia simbolista: antologia. São Paulo, SP: Melhoramentos, 1965.
p. 226.
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