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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

Péricles E. S. Ramos - Natal entre Árvores

Trazendo linhas metafóricas explícitas, em que árvores plantadas são como filhos aqui deixados, atingidos os limites mais que finitos de nossas vidas, este poema do paulista Péricles E. S. Ramos amplia a ideia do que seja a figura da Madona em épocas natalinas.

Assim, não só a mãe de Jesus ela representa, senão também a própria figura de esposa do poeta e mãe das árvores que, com ele, plantou durante a vida em comum. Por isso, pede a Deus o autor que as proteja quando ambos aqui já não estiverem, e verdes ainda os rebentos.

J.A.R. – H.C.

Péricles E. S. Ramos
(1919-1992)

Natal entre Árvores

Naquela tarde sem nuvens,
quis a Madona das Andorinhas
– com seus gestos de ar e vidro
e já um aroma de futuras violetas
em torno aos cabelos –

quis a Madona das Andorinhas
que plantássemos uma árvore
no chão de nossa casa:
e quando a semente caiu ao solo
os cabelos da Madona
faiscaram e cobriram-se de pétalas.

Hoje em nossa casa há três árvores;
três árvores ou sete mágoas?
sete mágoas ou quinhentas alegrias?

Crescem as árvores,
e com as árvores se esvai o nosso tempo,
e as árvores também são fuga
– e conversam com o ar, e contemplam as nuvens,
e procuram os ventos
– e já não são coisa nossa,
como no dia em que foram projeto,
inquietação, desejo de plantar.

Ao meu lado, porém,
continua a Madona, a Madona das Violetas,
a mão de que brotaram árvores,
o olhar que é um voo de andorinhas:
Madona, Madona,
há tempestades no horizonte:
como proteger as nossas árvores?

Que Deus ampare, Madona,
as árvores que, sendo efêmeros,
plantamos;
e que Deus nos cubra com Seu manto
– pois realmente somos um –
quando já não pudermos proteger, Madona,
entre violetas e andorinhas,
nossas árvores tão verdes.

Em: “Lua de Ontem” (1960)


Referência:

RAMOS, Péricles Eugênio da Silva. Natal entre árvores. In: __________. Poesia quase completa. Rio de Janeiro, RJ: Livraria José Olympio Editora, 1972. p. 119-120.

Um comentário:

  1. Que belo poema!
    Que bela escolha!
    Deu vontade de abraçar o Péricles Eugênio da Silva Ramos e até de carregá-lo no colo como se fosse o próprio "Menino Jesus"! .
    Esse poema de versos longos, tem metáforas inusitadas, sim, que nos abraçam e nos cobrem com seu manto, e cuida de nosso coração sensível. Essa proteção é a que o poeta pediu para as árvores.
    Quanta sensibilidade, meu Deus!
    Que belo poema!
    Que bela escolha!

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