Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

António Salvado - Poemas de Natal

Quatro poemas numa única postagem, cada qual com um título-ícone entre os muitos do Natal: musgo, sinos, manjedoira, noite branca. Reminiscências de Natais idos e vividos pelo poeta.

Em meio a essas lembranças, notam-se outros tantos símbolos caros às festas de fim de ano, como coros e filhós, de forma a caracterizar que o sarau se passa numa casa portuguesa, com certeza!

J.A.R. – H.C.

António Salvado
(n. 1936)

Poema de Natal (I - Musgo)
(SALVADO, 1999, p. 258-259)

Era verde   como os momentos quando
se abandonava a escola o professor o livro
e rua acima ou rua abaixo ardia
nos trotes de meus passos   (que distantes!)
em direcção à luz: anunciada,
reflectida no sonho há tanto tempo
e que em espera voltava regressava
a cintilar pausadamente lenta.

Porque o dia   – de cedo –   se vestia
ainda e tinha muito a caminhar:
as figuras   os rios   serras   iam
( também a neve ) alando os seus lugares.

Era macio o musgo do presépio
colocado   – em amor –   por entre pedras. 


Poema de Natal (II - Sinos)
(SALVADO, 1999, p. 259)

Em voz d’azeite os sinos badalavam
repercutindo no calor do cobre
apelos de fervor   felicidade
e risos d’harmonia:   fervorosas
preces caladas aguardando a hora.

Os astros derramavam o orvalho
da sua solidão por entre os coros
das vozes que entoavam pelos olhos
harpejos d’alegria   d’ostinatos
em cheiro de filhó com mais acordes.

Tão fria a noite na paixão das brasas:
os sinos a tocarem luminosos,
’strelas cadentes que se aproximavam,
o céu a dirigir-se a cada porta. 


Poema de Natal (III - Manjedoira)
(SALVADO, 1999, p. 259-260)

De longe que a manhã fora prescrita:
as armas recolheram aos museus
os campos   revestiram-se de trigo
o azul recente   coloriu o céu
d’além   da boca   e d’outros céus ainda,
aves voltaram   feitas peregrinas,
na terra acasalaram mais   os bichos,
no mar os peixes   destruíram breus.

Noite do caramelo   ameno dia
chegado ao lume do braseiro ardido:
véu rompido onde a paz vai reviver;
de boa e sã vontade se cobriu
o mundo:   os homens todos já se uniram!,

e nem um Deus precisa de nascer. 


Poema de Natal (IV - Noite Branca)
(SALVADO, 1999, p. 260)

Melodia macia   perfumada
a desta noite: bafo de surpresas,
odor dos troncos a resplandecerem
sabor do Encoberto regressado.

Os astros correm pela Terra acesa
ciciando palavras entre orvalho –
a directriz que denuncia os passos
por onde caminharmos sem receio.

Mistério d’encantado nascimento,
ela nos cobre com seu manto estranho
bordado a graça   a lar   a comunhão;

e nunca a voz do fogo foi mais viva:
a labareda cresce ao infinito
gestos d’amor surdindo em nossas mãos. 


Referência:

SALVADO, António. Obra III. A Plana Luz do Dia. Coimbra, PT: A Mar Arte, 1999.

2 comentários:

  1. http://www.crearensalamanca.com/carne-del-cielo-original-antologia-donde-47-poetas-iberoamericanos-vivos-celebran-la-navidad/


    Grande abraço. Festas Felizes.

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  2. Prezado,
    Agradeço bastante pelo 'link': baixei o livro e o guardei, para apreciá-lo com mais vagar. Um grande abraço e, igualmente, boas festas para você e familiares.
    João A. Rodrigues

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