Embora não saiba exatamente se se trata de um poema de Natal, a postagem
de hoje diz respeito a um nascituro – uma criança ainda a nascer –, que bem
pode ser o rebento do próprio poeta Afonso de Guimaraens Filho.
A propósito, como se poderia inferir, Alphonsus é filho do afamado poeta
mineiro Alphonsus de Guimaraens, um dos poetas luminares da escola literária simbolista.
J.A.R. – H.C.
Alphonsus de Guimaraens Filho
(1918-2008)
Nascituro
Que direi eu ao
nascituro?
Dar-lhe-ei um pouco
do escuro
sentimento que vem da
vida?
Ou direi antes da
impressentida
estrela que existe no
fundo
do mais amargo
sofrimento?
Dar-lhe-ei um pouco
do sentimento
escuro, de que é
feito o mundo?
Ou direi antes da
aflitiva
certeza – humílima
certeza –
de que a maior,
divina beleza,
não consola esta
coisa viva,
esta pobre, inquieta
argila,
que é o homem, com o
seu destino?
Ou direi antes ao
pequenino
que dorme na
antecâmara tranquila
palavras de uma
primavera
que os deuses
reservam para o que vem?
Que direi eu ao que
está sem
pecado ou culpa, ao
que não era
senão na minha
esperança, e agora
claro e preciso se
anuncia?
Dar-lhe-ei um pouco
do meu dia
ou viverei de sua
aurora?
Em: “O Mito e o Criador”
Bebê no Útero
(Dan Lacey: pintor
norte-americano)
Referência:
GUIMARAENS FILHO, Alphonsus. Nascituro.
In: CAMPOS, Milton de Godoy (Ed.). Antologia poética da geração de 45. 1ª série. São Paulo, SP: Clube de Poesia, 1966. p. 63-64.
Excelente captura, caro Rodrigues. Pessoalmente, entendo este como um dos mais inquietantemente belos poemas florescidos em língua portuguesa, com um primor formal que valoriza a mensagem, ao invés de simplesmente confiná-la na camisa-de-força do metro e da rima. Abraço do j. a. [Luz]
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