Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Eduardo Alves da Costa - Tentativa para salvar a poesia

Da lavra do poeta fluminense Eduardo Alves da Costa – o mesmo autor de “No caminho com Maiakóvski”, que muitos atribuem equivocadamente ao próprio Maiakóvski –, tem-se aqui um poema que expressa a tentativa de salvar a poesia mesma.

Se a poesia agoniza ou se faz beicinho de carência, isso pouco importa: vê-se no poema outras tantas experiências que a limitam, ou que, diversamente, servem como modo e motivo para criá-la, pulverizá-la neste vasto e louco mundo: “Vai, morena, pega teu rumo e toma tento que essa frescura te mata”.

J.A.R. – H.C.

Eduardo Alves da Costa
(n. 1936)

Tentativa para salvar a poesia

A poesia agoniza e eu choro
com medo de perder a vaga
de poeta.
Os mais velhos recomendam
cautela com a emoção,
repouso,
caldo de galinha
e linguagem à antiga.
Os fatalistas lamentam o cinema
e chamam ao nosso sáculo
o das artes visuais.
A televisão é a culpada
– sentencia um jornalista
versado em filatelia,
enquanto uma equipe
de cirurgiões estetas
luta para livrar o coração da enferma
de adiposidades românticas.
E eu, que havia programado
uma carreira nas letras
seguro a caneta
como um boi a olhar para um palácio.
Cruzo na sala de espera
com médicos anestesistas
concretistas
praxistas
e derrubo uma bandeja
de letrinhas coloridas,
espaços em branco,
idiogramas chineses,
balas
    belas
         bílis
            bolas
                 bulas
e seringas.
Quando dou por mim
estou chutando um caranguejo
e comendo bala de goma
e limpando um cisco na dragona
enquanto o dragão não vem.
Quero ver quem tem
coragem para contestar
leva rasteira quem se levantar
e toma golpe de karatê
e cotovelo na cotovia
e samba de breque
teleco-teco
peteleco na orelha
– segura, meu chapa!
e é só esteta voando
contra a parede
com nariz de sangue
e olho inchado de levar porrada.
Abro a porta
e mando a doente
sair pela tangente
com um tapa no traseiro
e outros babados.

A menina não tem nada, minha gente.
Vai, morena, pega teu rumo
e toma tento
que essa frescura
te mata.

Marabá
(Rodolpho Amoêdo: artista brasileiro)

Referência:

COSTA, Eduardo Alves. Tentativa para salvar a poesia. In: FELIX, Moacyr (Dir.) Poesia viva I. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968. p. 204-206. (Coleção Poesia Hoje, Volume 18, Série Novos Poetas do Brasil)

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