Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 15 de setembro de 2015

John Donne - Soneto Sacro I

Eis aqui duas traduções para o mesmo primeiro soneto sacro, de autoria do ministro anglicano e um dos mais importantes membros da denominada escola de “poetas metafísicos”, John Donne.

Trata-se de um diálogo direto com o Eterno, para que este se apresse em “consertá-lo”, antes que Satã tome conta de sua alma e a morte o arraste para longe das primícias do Paraíso.

Em tempo: a analogia que Donne emprega nos últimos versos do soneto fez-me lembrar das lições preliminares de “Magnetismo e Teoria Eletromagnética” (rs): Deus seria como um ímã colossal, capaz de atrair o coração de ferro do poeta.

J.A.R. – H.C.

John Donne
(1572-1631)

Holy Sonnet I
(DONNE, 1985, p. 34)

Thou hast made me, and shall thy worke decay?
Repaire me now, for now mine end doth haste,
I runne to death, and death rneets me as fast,
And all my pleasures are like yesterday;

I dare not move my dimme eyes any way,
Despaire behind, and death before cloth cast
Such terrour, and my feeble flesh doth waste
By sinne in it, which it t'wards hell doth weigh;

Onely thou art above, and when towards thee
By thy leave I can looke, I rise againe;
But our old subtle foe so ternpteth me,

That not one houre my selfe I can sustaine;
Thy Grace may wing me to prevent his art,
And thou like Adamant draw mine iron heart.

A Tentação de Eva (detalhe)
(Michelangelo: artista italiano)

Soneto Sacro I
(DONNE, 1985, p. 35)

Devo desintegrar-me, eu, que sou tua obra?
Então salva-me já, pois já meu fim se apressa,
Vou rumo à morte, e a morte meu caminho atravessa,
Meus prazeres são todos de um ontem que soçobra;

Não ouso nem mover o olhar turvo, ó Eterno!
Atrás o desespero, e à frente a morte lança
Um tal terror, que a carne, tão frágil na balança,
Pende por seus pecados na direção do inferno.

Só tu estás acima, e quando para olhar-te
Deixas que eu erga os olhos, eu me ergo novamente;
Mas tenta-me o inimigo nosso e, por mais que o tente,

Nem por um só instante venço-lhe as manhas e a arte;
Que tua Graça me arme com asas, e não mais erro;
Como um ímã, suspende meu coração de ferro.

A Tentação de Cristo por Satã
(Félix-Joseph Barrias: pintor francês)

Soneto Sacro I
(DONNE, 1991, p. 65)

Tu me fizeste, e tua obra se desfaz?
Então repara-me, porque meu fim se apressa,
Vou rumo à morte, que de buscar-me não cessa;
Já é de ontem todo o meu prazer falaz.

Não sei para onde voltar os olhos neste instante
De terror; da minha carne, em extrema fraqueza,
Por suas próprias culpas, o inferno faz sua presa;
E eu vejo o desespero atrás e a morte adiante.

Só tu pairas no alto, e meu ser só consegue
Erguer-se, se, por Graça, a ti dirijo o olhar;
Mas nem uma hora assim posso mais sustentar,

Pois teu velho, hábil inimigo me persegue.
Contra ele, dá-me asas; e, qual ímã, então,
Atrai a ti o ferro do meu coração.

Referências:

DONNE, John. Holy sonnet I / Soneto sacro I. In: __________. Sonetos de meditação. Edição bilíngue. Tradução de Afonso Félix de Sousa. Rio de Janeiro, RJ: Philobiblion, 1985. (Coleção ‘Poesia, sempre’)

DONNE, John. Holy sonnet I / Soneto sacro I. In: SHAKESPEARE, William et al. Poesia metafísica. Edição bilíngue. Seleção, tradução, introdução e notas de Aíla de Oliveira Gomes. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 1991.

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