No passado, o gato cumpriu a sua missão
de livrar as caravelas de roedores indesejados, afirma-nos a poetisa portuguesa
Inês Lourenço. Mas... e hoje? Um gato hoje já nasce sem finalidade alguma,
senão pela grata beleza de existir!
Completemos, contudo, a sua ideia: hoje
serve para “decorar” os nossos sofás ou telhados; para dar exemplo de limpeza
para alguns humanos ainda no estágio selvagem, a passar pelas ruas de nossas
cidades – Brasília aí inclusa –, atirando ao léu tudo quanto é tipo de lixo, saído de seus pertences ou das janelas dos automóveis.
Se não for outra a hipótese, diríamos
que o senso de limpeza dessa gente tende a ser tão apenas privado – e se tanto,
pois cremos que a prática tende a ser a mesma em casa ou na rua! “Mala Educación”,
diria o cineasta Pedro Almodóvar!
J.A.R. – H.C.
Inês Lourenço
(n. 1942)
Préstimo
Ao Eugénio de Andrade
Um gato não serve
realmente
para nada, vão quase
seis séculos
desde o tempo das
caravelas
onde embarcou com os
marítimos para
extermínio dos
roedores que
infestavam o porão
das naus. Agora
só o dorso oferece às
carícias
ou ao regaço o peso
do pequeno corpo,
ronronando
a grata beleza de
existir.
Referência:
LOURENÇO, Inês. Préstimo. In:
GUIMARÃES, João Luís Barreto (Org.). Assinar
a pele: antologia de poesia contemporânea sobre gatos. Lisboa, PT: Assírio
& Alvim, 2001. p. 96.
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