Sobre o poder das palavras é o que versam os versos livres do poema do
cearense Francisco Carvalho, objeto desta postagem: aquele poder de criar
mundos – ou de refleti-los, se são mundos encapsulados na mente humana.
A alegoria da bolha de sabão que o poeta adota se amolda à excelência ao
dispersar das palavras de nossos lábios para realidades além de nossa própria
solidão. À conquista de outros espaços, alienígenas, insuspeitados. À
satisfação de nossos propósitos que, bem antes, fervem atrás de portas ainda
não transpostas.
J.A.R. – H.C.
Francisco Carvalho
(1927-2013)
Bolhas de Sabão
Os homens se divertem
com as palavras
como as crianças se
divertem com bolhas de sabão.
Ai daquele que põe o
coração nas palavras
porque depois vem a
perdê-lo
como se perde a
identidade da imagem num espelho
partido.
Ai daquele que
depositou seu fardo de sonhos
às costas das
palavras.
As palavras são como
as velas de uma nau que perdesse
a rota da bússola.
Teu coração é um
labirinto de palavras
mas as palavras
precisam de tuas sensações para existir
e as tuas sensações
não são menos abstratas
do que as sete
verdades do arco-íris.
Mastigas diariamente
as palavras
como se elas fossem
um bálsamo para a alma.
As palavras te
governam e te configuram
delimitam as
fronteiras de tua solidão
os caminhos da
eternidade e do adeus.
As palavras assinalam
o momento de tua morte
e te ensinam a abrir
a porta onde não existe porta.
Referência:
CARVALHO, Francisco. Bolhas de sabão. In: PINTO, José Nêumanne (Sel.). Os cem melhores poetas brasileiros do
século. São Paulo, SP: Geração, 2001. p. 223-224.
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