Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Carlos Ávila - Obstáculos

Há muitos obstáculos à beleza, em especial nos centros urbanos: placas de propaganda abusivamente distribuídas às margens de nossas autopistas; lixo por toda a parte e, sobretudo, o concentrado nos depósitos a céu aberto; rios degradados pelos dejetos industriais etc.

Mas a beleza resiste mesmo à pobreza: é o que comprova o artista plástico paulista, radicado nos EUA, Vik Muniz. É louvável o trabalho que ele empreendeu com os catadores de materiais recicláveis retirados do Jardim Gramacho, Duque de Caxias, Rio de Janeiro, levado às telonas pelo documentário “Lixo Extraordinário”, de 2010. Se você estiver com um tempo disponível, veja a película  que postamos a seguir:

  
J.A.R. – H.C.

Carlos Ávila
(n. 1955)

Apreciação de Manuel da Costa Pinto (2006, p. 48-49)

Com um processo criativo que se coloca sob o arco de influência da poesia concreta, Ávila trabalha aqui a relação significante-significado de um modo que assimila outras referências estéticas. A palavra “obstáculo” constitui, ela mesma, por força de sua repetição, aquilo que oblitera a “beleza/ de todo tipo/ em toda parte/ [...] de todo lado/ em todo estado”. O resultado é um poema que dá substância visual a sua “mensagem”, ou seja, em que a espacialidade e a materialidade das palavras cadenciam uma leitura feita de obstáculo em obstáculo(*). Essa correspondência rigorosa entre forma e conteúdo corresponde àquilo que os concretos chamam de “isomorfismo”, mas seria impossível não pensar também na “pedra no meio do caminho” de Drummond ou mesmo na filiação (real e simbólica) de Carlos Ávila — uma vez que, assim como seus pais (os poetas Affonso Ávila e Laís Corrêa de Araújo), o autor de Bissexto Sentido agrega ao experimentalismo poético um sentido crítico e satírico.

Principais Obras: Aqui & Agora (1981), Sinal de Menos (1989) – reunidos em Bissexto Sentido (Perspectiva, 1999), que também inclui a série Ásperos – e Obstáculos (Memória Gráfica, 2004).

(*). Originalmente, cada conjunto de quatro versos desse poema ocupa uma página ímpar do livro Obstáculos, criando uma sequência de blocos de palavras cujo efeito rítmico e visual não pôde ser reproduzido aqui.

Caos Urbano
(Randy Vosbeck: pintor norte-americano)

Obstáculos

obstáculos
à beleza
de todo tipo
em toda parte

não há país
nem paisagem
a voz não soa
a vida à toa

obstáculos
à beleza
de todo lado
em todo estado

assassinato
sem assinatura
palavra calada
mera rasura

obstáculos
à beleza
pouco ar
em todo lugar

apenas tédio
gosto médio
ofício sem ossos
oficina do ócio

obstáculos
à beleza
obstáculos
obstáculos

(De: “Obstáculos”)

Referência:

ÁVILA, Carlos. Obstáculos. In: PINTO, Manuel da Costa (Edição, Seleção e Comentários). Antologia comentada da poesia brasileira do século 21. São Paulo: Publifolha, 2006. p. 47-48.

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