Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quinta-feira, 13 de novembro de 2025

João Cabral de Melo Neto - O fim do mundo

O poeta descreve um mundo onde os homens leem jornais e comem laranjas sem expressarem quaisquer emoções – presos, por conseguinte, às suas atividades quotidianas –, o que denuncia a apatia e a rotina que os dominam, faltos, como se vê, daquele sentido de urgência angustiosa, a despeito das circunstâncias extremas, tão lindeiras a um completo desmoronamento.

 

O “fim do mundo” mais parece essa imersão no mar de indiferenças, tão iminentemente catastrófico que ninguém se disporá a redigir o “poema final”. Entrementes, o poeta se preocupa mesmo é com o “sonho final”, talvez um laivo de esperança ou um último desejo, antes que tudo se acabe pelo efeito multiplicador da morte que se banaliza.

 

J.A.R. – H.C.

 

João Cabral de Melo Neto

(1920-1999)

 

O fim do mundo

 

No fim de um mundo melancólico

os homens leem jornais.

Homens indiferentes a comer laranjas

que ardem como o sol.

 

Me deram uma maçã para lembrar

a morte. Sei que cidades telegrafam

pedindo querosene. O véu que olhei voar

caiu no deserto.

 

O poema final ninguém escreverá

desse mundo particular de doze horas.

Em vez de juízo final a mim preocupa

o sonho final.

 

Em: “O Engenheiro” (1945)

 

Homem lendo jornal

(Cliff Wilson: artista norte-americano)

 

Referência:

 

MELO NETO, João Cabral de. O fim do mundo. In: __________. Poesias completas: 1940-1965. 2. ed. Rio de Janeiro, GB: José Olympio, 1975. p. 346.

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