Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sexta-feira, 24 de outubro de 2025

Pablo Neruda - Os Enigmas

Neruda enceta uma espécie de diálogo entre a voz lírica e um interlocutor, onde o primeiro busca responder às perguntas do segundo com uma sabedoria ancestral, própria de quem conhece os segredos mais profundos da natureza: trata-se de um dos mais de duzentos poemas que compõe o “Canto Geral” (1950), um ciclo épico atinente à história das Américas sob um enfoque dominantemente hispano-americano.

 

Os mitos, os segredos e os mistérios, bem assim as amplas lacunas que temos sobre as incógnitas vidas que existem nos vastos pélagos oceânicos, deveriam nos tornar conscientes acerca da necessidade de preservação do biossistema marinho, tanto quanto de compreender ou decifrar por completo seus arcanos, até mesmo os fenômenos naturais que a tudo presidem – para que possamos, se for necessidade, sempre agir sobre eles de modo consequente.

 

J.A.R. – H.C.

 

Pablo Neruda

(1904-1973)

 

Los Enigmas

 

Me habéis preguntado qué hila el crustáceo entre

sus patas de oro y os respondo: El mar lo sabe.

¿Me decís qué espera la ascidia en su campana transparente?

¿Qué espera? Yo os digo, espera como vosotros el tiempo.

Me preguntáis a quién alcanza el abrazo del alga Macrocustis?

Indagadlo, indagadlo a ciertahora, en cierto mar que conozco.

Sin duda me preguntareis por el marfil maldito del narwhal, (*)

para que yo os conteste

de qué modo el unicornio marino agoniza arponeado.

¿Me preguntáis tal vez por las plumas alcionárias que tiemblan

en los puros orígenes de la marea austral?

¿Y sobre la construcción cristalina del polipo habéis barajado,

sin duda,

una pregunta más, desgranándola ahora?

¿Queréis saber la eléctrica materia de las púas del fondo?

¿La armada estalactita que camina quebrándose?

¿El anzuelo del pez pescador, la música extendida

en la profundidad como un hilo en el agua?

 

Yo os quiero decir que esto lo sabe el mar, que la vida

en sus arcas

es ancha como la arena, innumerable y pura

y entre las uvas sanguinarias el tiempo ha pulido

la dureza de un pétalo, la luz de la medusa

y ha desgranado el ramo de sus hebras corales

desde una cornucopia de nácar infinito.

 

Yo no soy sino la red vacía que adelanta

ojos humanos, muertos en aquellas tinieblas,

dedos acostumbrados al triangulo, medidas

de un tímido hemisferio de naranja.

 

Anduve como vosotros escarbando

la estrella interminable,

y en mi red, en la noche, me desperté desnudo,

única presa, pez encerrado en el viento.

 

Em: “Canto General” (1950)

 

O mistério do mar

(Magdalena Knight: artista polonesa)

 

Os Enigmas

 

Perguntastes-me o que fia o crustáceo entre

as suas patas de ouro e eu vos respondo: O mar é que sabe.

Dizeis-me o que espera a caravela no seu sino transparente?

O que espera? Eu vos digo, espera como vós o tempo.

Perguntais-me a quem atinge o abraço da alga Macrocustis?

Indagai-o, a certa hora, em certo mar que conheço.

Sem dúvida perguntar-me-eis pelo marfim maldito do narwhal,

para que eu vos responda

de que modo o unicórnio marinho agoniza arpoado.

Perguntais-me talvez pelas penas alcionárias que tremem

nas puras origens da maré austral?

E sobre a construção cristalina do pólipo enredastes,

sem dúvida,

uma pergunta mais, desfiando-a agora?

Quereis saber a elétrica matéria dos ouriços do fundo?

A armada estalactite que caminha se quebrando?

O anzol do peixe pescador, a música estendida

na profundidade como um fio na água?

 

Eu vos quero dizer que isto quem sabe ó o mar, que a vida

nas suas arcas

é larga como a areia, inumerável e pura

e entre as uvas sanguinárias o tempo poliu

a dureza de urna pétala, a luz da medusa

e debulhou o ramo das suas fibras corais

de urna cornucópia de nácar infinito.

 

Eu não sou senão a rede vazia que adianta

olhos humanos, mortos naquelas trevas,

dedos acostumados ao triângulo, medidas

de um tímido hemisfério de laranja.

 

Andei como vós arranhando

a estrela interminável,

e na minha rede, na noite, acordei nu,

única presa, peixe encerrado no vento.

 

Em: “Canto Geral” (1950)

 

Nota:

 

(*). Narwhl: cetáceo marinho.

 

Referência:

 

NERUDA, Pablo. Los enigmas / Os enigmas. Tradução de Eliane Zagury. In: __________. Antologia poética. Tradução de Eliane Zagury. Edição bilíngue: espanhol x português. 22. ed. Rio de Janeiro, RJ: José Olympio, 2012. Em espanhol e em português: p. 173-175.

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