A necessidade de amar
e de viver intensamente não admite dilações por parte do poeta: há suficiente
urgência existencial por experimentar essa força vital e transformadora, capaz
de romper os grilhões da opressão asfixiante e levar ao máximo o exercício da
liberdade.
Rosa emprega a
metáfora do abraço como uma “arma de dois gumes”, para deixar claro que o amor
e o ódio acham-se entrelaçados, pois que a traduzir a expressão física de um afeto
que, em simultâneo, pode simbolizar tanto a resistência quanto a unidade em
tempos de adversidade.
Pospor indefinidamente
tais experiências essenciais, aos olhos do sujeito lírico, seria uma forma de
negar-se a si mesmo, fugindo dos compromissos do presente, de um quotidiano
pejado de incertezas, mas que, de todo modo, é o único que se tem para dar voltas
aos seus obstáculos, enquanto não se descortina uma alvorada mais clara.
J.A.R. – H.C.
António Ramos Rosa
(1924-2013)
Não posso adiar o
amor para outro século
Não posso adiar o
amor para outro século
não posso
ainda que o grito
sufoque na garganta
ainda que o ódio
estale e crepite e arda
sob montanhas
cinzentas
e montanhas cinzentas
Não posso adiar este
abraço
que é uma arma de
dois gumes
amor e ódio
Não posso adiar
ainda que a noite
pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa
demore
não posso adiar para
outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de
libertação
Não posso adiar o
coração
O amor é liberdade
(Paresh Nrshinga:
artista queniano)
Referência:
ROSA, António Ramos. Não posso adiar o amor para outro século. In: __________. A palavra e o lugar. Lisboa, PT: Dom Quixote, 1977. p. 19.
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