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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 28 de outubro de 2025

António Ramos Rosa - Não posso adiar o amor para outro século

A necessidade de amar e de viver intensamente não admite dilações por parte do poeta: há suficiente urgência existencial por experimentar essa força vital e transformadora, capaz de romper os grilhões da opressão asfixiante e levar ao máximo o exercício da liberdade.

 

Rosa emprega a metáfora do abraço como uma “arma de dois gumes”, para deixar claro que o amor e o ódio acham-se entrelaçados, pois que a traduzir a expressão física de um afeto que, em simultâneo, pode simbolizar tanto a resistência quanto a unidade em tempos de adversidade.

 

Pospor indefinidamente tais experiências essenciais, aos olhos do sujeito lírico, seria uma forma de negar-se a si mesmo, fugindo dos compromissos do presente, de um quotidiano pejado de incertezas, mas que, de todo modo, é o único que se tem para dar voltas aos seus obstáculos, enquanto não se descortina uma alvorada mais clara.

 

J.A.R. – H.C.

 

António Ramos Rosa

(1924-2013)

 

Não posso adiar o amor para outro século

 

Não posso adiar o amor para outro século

não posso

ainda que o grito sufoque na garganta

ainda que o ódio estale e crepite e arda

sob montanhas cinzentas

e montanhas cinzentas

 

Não posso adiar este abraço

que é uma arma de dois gumes

amor e ódio

 

Não posso adiar

ainda que a noite pese séculos sobre as costas

e a aurora indecisa demore

não posso adiar para outro século a minha vida

nem o meu amor

nem o meu grito de libertação

 

Não posso adiar o coração

 

O amor é liberdade

(Paresh Nrshinga: artista queniano)

 

Referência:

 

ROSA, António Ramos. Não posso adiar o amor para outro século. In: __________. A palavra e o lugar. Lisboa, PT: Dom Quixote, 1977. p. 19.

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