Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 8 de outubro de 2025

Boris Pasternak - A Morte do Poeta

Para um dia ordinário, a perda extraordinária: Pasternak oferece este canto fúnebre à memória do poeta e dramaturgo russo Vladimir Maiakóvski (1893-1930) – homem ainda jovem e talentoso –, cuja morte por suicídio a todos consternou, entre incrédulos e resignados.

 

Em paralelo às imagens suscitadas pela linguagem poética, Pasternak captura o sentido irreparável de tal perda, dando-nos um testemunho comovedor da amizade e respeito que sentia por seu colega: crê o autor que, pelo poder da arte desenvolvida por Maiakóvski, seu nome continuará a inspirar as gerações futuras, com fundamento no impacto revolucionário do legado que deixou, transpassado pela rebeldia de seu gênio.

 

J.A.R. – H.C.

 

Boris Pasternak

(1890-1960)

 

Смерть Поэта

 

Не верили, считали - бредни,

Но узнавали от двоих,

Троих, от всех. Равнялись в строку

Остановившегося срока

Дома чиновниц и купчих,

Дворы, деревья, и на них

Грачи, в чаду от солнцепека

Разгоряченно на грачих

Кричавшие, чтоб дуры впредь не

Совались в грех, да будь он лих.

Лишь бы на лицах влажный сдвиг,

Как в складках порванного бредня.

 

Был день, безвредный день, безвредней

Десятка прежних дней твоих.

Толпились, выстроясь в передней,

Как выстрел выстроил бы их.

 

Как, сплющив, выплеснул из стока б

Лещей и щуку минный вспых

Шутих, заложенных в осоку,

Как вздох пластов нехолостых.

 

Ты спал, постлав постель на сплетне,

Спал и, оттрепетав, был тих,-

Красивый, двадцатидвухлетний.

Как предсказал твой тетраптих.

 

Ты спал, прижав к подушке щеку,

Спал,- со всех ног, со всех лодыг

Врезаясь вновь и вновь с наскоку

В разряд преданий молодых.

 

Ты в них врезался тем заметней,

Что их одним прыжком достиг.

Твой выстрел был подобен Этне

В предгорьи трусов и трусих.

 

1930

 

Vladimir Maiakóvski

(1893-1930)

 

A Morte do Poeta

 

Não queríamos crer – delírio!

Mas dois, três, todos incessantes,

O repetiam. Ajustados no trilho

Do instante, estacavam os domicílios

De burocratas e comerciantes.

Áreas e árvores, e no alto sobre os galhos

Corvos no fumo do sol fogo

Ralhavam com esposas-gralhas:

Que não metêssemos nariz no pecado

As tolas! Todas ao diabo!

Mas nos rostos, um úmido descomposto

Como nas pregas de uma rede rota.

 

Um dia inócuo, inócuo, mais inócuo

Que uma dezena de teus dias passados.

No vestíbulo, a turba se coloca

Em fila, premida por um disparo.

 

Como um jorro de lúcios e de bremas

Achatados, cuspidos das maremas

Pelo estouro de um petardo entre caniços,

Como um suspiro de tiros não fictícios.

 

O leito armado sobre a maledicência,

Você dormia, agora plácido, em paz.

Vinte e dois anos, belo, e a pré-ciência

De tudo isto em teu poema quadriparte. (*)

 

Você dormia, rosto preso ao travesseiro,

Dormia, a plenas pernas, a plenos tornozelos,

Penetrando de novo, de um só golpe,

No fabulário das legendas jovens.

 

E penetrando da maneira mais direta

Porque nele você entrava de um salto.

Teu disparo parecia um Etna

Sobre as encostas de covardes e fracos.

 

1930

 

Nota do Tradutor (Haroldo de Campos):

 

(*). Alusão ao poema “A Nuvem de Calças”, composto de um prólogo e quatro partes, escrito por Maiakóvski em 1915, quando ele tinha 22 anos.

 

Referências:

 

Em Russo

 

Пастернак, Борис. Смерть поэта. Disponível neste endereço. Acesso em: 6 out. 2025.

 

Em Português

 

PASTERNAK, Boris. A morte do poeta. Tradução de Haroldo de Campos. In: CAMPOS, Augusto de; CAMPOS, Haroldo de; SCHNAIDERMAN, Boris (Orgs. e Trads.). Poesia moderna russa. 6. ed. rev. e ampl. São Paulo, SP: Perspectiva, 2001. p. 200-201. (Coleção ‘Signos’; v. 33)

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