Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Seamus Heaney - Tempestade na Ilha

Nestes versos, Heaney descreve-nos, com riqueza de detalhes, a inclemência das forças naturais e a resiliência dos que vivem em uma ilha remota – não especificamente nomeada –, açoitada por impetuosas tormentas: o falante personifica a voz dos insulanos, dando-nos conta de que se preparam construindo casas robustas, assentes na rocha e cobertas com ardósia de boa qualidade, ao mesmo tempo que adotam limites à presença de árvores nas adjacências, pelas chances de soltarem folhas e até mesmo galhos que possam atingir as moradias – expostas, de todo modo, ao jorro espumante das águas do mar que se projetam sobre as falésias.

 

Depois de tudo o quanto se pormenoriza, pode parecer paradoxal que, segundo a voz lírica, os ilhéus temam um “enorme nada”, como se estivessem sendo confrontados com o vazio insondável – quase metafísico – de forças primigênias.

 

Contudo, talvez, o poeta tenha empregado essa forma expressiva para enfatizar que o que atemoriza os ilhéus não seja tanto a força destrutiva tangível, senão a vastidão incomensurável e impessoal das forças naturais desencadeadas, o poder cego e impávido de uma natureza indômita que não pode ser submetida ou controlada.

 

J.A.R. – H.C.

 

Seamus Heaney

(1939-2013)

 

Storm on the Island

 

We are prepared: we built our houses squat,

Sink walls in rock and roof them with good slate.

This wizened earth has never troubled us

With hay, so, as you see, there are no stacks

Or stooks that can be lost. Nor are there trees

Which might prove company when it blows full

Blast: you know what I mean – leaves and branches

Can raise a tragic chorus in a gale

So that you listen to the thing you fear

Forgetting that it pummels your house too.

But there are no trees, no natural shelter.

You might think that the sea is company,

Exploding comfortably down on the cliffs,

But no: when it begins, the flung spray hits

The very windows, spits like a tame cat

Turned savage. We just sit tight while wind dives

And strafes invisibly. Space is a salvo,

We are bombarded by the empty air.

Strange, it is a huge nothing that we fear.

 

In: “Death of a naturalist” (1966)

 

Paisagem marinha com embarcação

camaroeira em dia tempestuoso

(Roos Schuring: artista holandesa)

 

Tempestade na Ilha

 

Estamos preparados: as casas robustas,

Têm paredes postas na pedra e bem cobertas.

Esta terra seca nunca nos perturbou

Com feno, assim, como pode ver, não há medas

Ou montes que possam perder-se. Nem há árvores

Que nos façam companhia ao soprar violento

O vento: sabe o que digo – folhas e galhos

Entoam um coro trágico no vendaval

De forma que você escute ao que teme e

Esqueça que ele também golpeia a sua casa.

Não há árvores, nem abrigo natural.

Você pensaria que o mar é companheiro,

Explodindo tranquilo abaixo dos penhascos,

Mas não: quando começa, os borrifos atingem

As janelas, cospem qual gato manso feito

Selvagem. Abraçamo-nos enquanto o vento,

Invisível, atira. O espaço é uma rajada,

Somos bombardeados pelo ar vazio.

Estranho, o que tememos é um enorme nada.

 

Em: “Morte de um naturalista” (1966)

 

Referência:

 

HEANEY, Seamus. Storm on the island / Tempestade na ilha. Tradução de Marcelo Tápia. In: TÁPIA, Marcelo. Poemas irlandeses. USP/FFLCH, Cadernos de Literatura em Tradução, n. 7, p. 85-107. Em inglês: p. 89; em português: p. 90.

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