Nestes versos, Heaney
descreve-nos, com riqueza de detalhes, a inclemência das forças naturais e a
resiliência dos que vivem em uma ilha remota – não especificamente nomeada –,
açoitada por impetuosas tormentas: o falante personifica a voz dos insulanos,
dando-nos conta de que se preparam construindo casas robustas, assentes na
rocha e cobertas com ardósia de boa qualidade, ao mesmo tempo que adotam limites à presença de árvores nas adjacências, pelas chances de soltarem folhas e até
mesmo galhos que possam atingir as moradias – expostas, de todo modo, ao jorro
espumante das águas do mar que se projetam sobre as falésias.
Depois de tudo o
quanto se pormenoriza, pode parecer paradoxal que, segundo a voz lírica, os ilhéus
temam um “enorme nada”, como se estivessem sendo confrontados com o vazio
insondável – quase metafísico – de forças primigênias.
Contudo, talvez, o
poeta tenha empregado essa forma expressiva para enfatizar que o que atemoriza
os ilhéus não seja tanto a força destrutiva tangível, senão a vastidão
incomensurável e impessoal das forças naturais desencadeadas, o poder cego e impávido
de uma natureza indômita que não pode ser submetida ou controlada.
J.A.R. – H.C.
Seamus Heaney
(1939-2013)
Storm on the Island
We are prepared: we
built our houses squat,
Sink walls in rock
and roof them with good slate.
This wizened earth has
never troubled us
With hay, so, as you
see, there are no stacks
Or stooks that can be
lost. Nor are there trees
Which might prove
company when it blows full
Blast: you know what
I mean – leaves and branches
Can raise a tragic
chorus in a gale
So that you listen to
the thing you fear
Forgetting that it
pummels your house too.
But there are no
trees, no natural shelter.
You might think that
the sea is company,
Exploding comfortably
down on the cliffs,
But no: when it
begins, the flung spray hits
The very windows,
spits like a tame cat
Turned savage. We
just sit tight while wind dives
And strafes
invisibly. Space is a salvo,
We are bombarded by
the empty air.
Strange, it is a huge
nothing that we fear.
In: “Death of a
naturalist” (1966)
Paisagem marinha com
embarcação
camaroeira em dia
tempestuoso
(Roos Schuring:
artista holandesa)
Tempestade na Ilha
Estamos preparados:
as casas robustas,
Têm paredes postas na
pedra e bem cobertas.
Esta terra seca nunca
nos perturbou
Com feno, assim, como
pode ver, não há medas
Ou montes que possam
perder-se. Nem há árvores
Que nos façam
companhia ao soprar violento
O vento: sabe o que
digo – folhas e galhos
Entoam um coro
trágico no vendaval
De forma que você
escute ao que teme e
Esqueça que ele também
golpeia a sua casa.
Não há árvores, nem
abrigo natural.
Você pensaria que o
mar é companheiro,
Explodindo tranquilo
abaixo dos penhascos,
Mas não: quando
começa, os borrifos atingem
As janelas, cospem
qual gato manso feito
Selvagem.
Abraçamo-nos enquanto o vento,
Invisível, atira. O
espaço é uma rajada,
Somos bombardeados
pelo ar vazio.
Estranho, o que
tememos é um enorme nada.
Em: “Morte de um
naturalista” (1966)
Referência:
HEANEY, Seamus. Storm
on the island / Tempestade na ilha. Tradução de Marcelo Tápia. In: TÁPIA,
Marcelo. Poemas irlandeses. USP/FFLCH, Cadernos de Literatura em
Tradução, n. 7, p. 85-107. Em inglês: p. 89; em português: p. 90.
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