Numa visão crítica e provocativa,
Lawrence, acercando-se do tema da democracia, expressa com mordacidade a sua
rejeição tanto à burguesia endinheirada e desprovida de autenticidade, quanto à
classe trabalhadora oprimida e resignada, pois que, tanto uma quanto a outra, perderam
por completo a luz interior, a insuspeição, a dignidade.
A rigor, o poeta revela
certa dualidade em sua posição política e social: de um lado, considera-se um democrata,
porque valoriza a liberdade inata nos homens – representada metaforicamente como
o sol que neles brilha –; e de outro, identifica-se como aristocrata em sua
repulsa às pessoas de mente estreita, possessivas, sem fulgor próprio, imersas numa
espécie de escuridão espiritual, as quais, a seu ver, sequer merecem existir.
J.A.R. – H.C.
D. H. Lawrence
(1885-1930)
Democracy
I am a democrat in so
far as I love the free sun in men
and an aristocrat in
so far as I detest narrow-gutted,
possessive persons.
I love the sun in any
man
when I see it between
his brows
clear, and fearless,
even if tiny.
But when I see these
grey successful men
so hideous and
corpse-like, utterly sunless,
like gross successful
slaves mechanically waddling,
then I am more than
radical, I want to work a guillotine.
And when I see
working men
pale and mean and
insect-like, scuttling along
and living like lice,
on poor money
and never looking up,
then I wish, like
Tiberius, the multitude had only one head
so that I could lop
it off.
I feel that when
people have gone utterly sunless
they shouldn’t exist.
In: “Pansies” (1929)
A democracia está
morta
(Ian Thuillier:
artista irlandês)
Democracia
Sou democrata na
medida em que amo o livre sol
nos homens
e aristocrata na
medida em que detesto as possessivas,
tacanhas criaturas.
Amo o sol em qualquer
homem,
quando o vejo na
fronte,
claro, sem temor,
ainda que frágil.
Mas, quando vejo os
pardos homens prósperos,
hórridos e
cadavéricos, inteiramente sem sol,
como obscenos
escravos prósperos saracoteando-se
mecanicamente,
então sou mais que
radical, desejo a guilhotina.
E quando vejo os que
trabalham,
pálidos e vis como
insectos, às corridas
e como piolhos
vivendo, com dinheiro contado
e sem nunca erguer os
olhos,
então, como Tibério,
desejo que a multidão tivera
uma cabeça
para decepá-la de um
só golpe.
Eu penso que, quando
as gentes perderam totalmente
o sol,
não têm direito a
existir.
Em: “Pensamentos”
(1929)
Referências:
Em Inglês
LAWRENCE, D. H.
Democracy. In: __________. The complete poems of D. H. Lawrence. Collected
and edited with an introduction and notes by Vivian de Sola Pinto and F. Warren
Roberts. 1st ed., 6th repr. New York, NY: Penguin Books, 1988. p. 526.
Em Português
LAWRENCE, D. H.
Democracia. Tradução de Jorge de Sena. In: SENA, Jorge de (Antologia, tradução,
prefácio e notas). Poesia do século XX: de Thomas Hardy a C. V.
Cattaneo. Porto, PT: Editorial Inova, jul. 1978. p. 241-242. (Colecção “As mãos
e os frutos”; v. 14)
❁


Nenhum comentário:
Postar um comentário