O falante passa por
uma experiência apaixonada e obsediante em sua busca pelo amor, tanto em sua
alçada onírica quanto na realidade física, pautadas ambas por uma oposição entre
“encontrá-lo” e “perdê-lo”, o que sugere uma relação turbulenta, marcada por
presenças e ausências, ou mesmo proximidades e distanciamentos de seu objeto de
desejo.
O desvanecimento da
fronteira entre sonho e realidade acaba por ministrar uma atmosfera de certo modo
surrealista ao poema, num ciclo reiterado, ao mesmo tempo de constância e de fugacidade,
de procura tenaz por sua amada, mesmo diante da antevisão de que, encontrando-a,
nada a impedirá de voltar a engolfar-se nas veredas de incógnitas cercanias.
J.A.R. – H.C.
Mário Cesariny
(1923-2006)
Em todas as ruas te
encontro
Em todas as ruas te
encontro
Em todas as ruas te
perco
conheço tão bem o teu
corpo
sonhei tanto a tua
figura
que é de olhos
fechados que eu ando
a limitar a tua
altura
e bebo a água e sorvo
o ar
que te atravessou a
cintura
tanto, tão perto, tão
real
que o meu corpo se
transfigura
e toca o seu próprio
elemento
num corpo que já não
é seu
num rio que
desapareceu
onde um braço teu me
procura
Em todas as ruas te
encontro
Em todas as ruas te
perco
Rua sob chuva
(Jacques Volpi:
pintor francês)
Referência:
CESARINY, Mário. Em
todas as ruas te encontro. In: __________. Pena capital. Lisboa, PT:
Contraponto, 1957. p. 31.
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