Melo Neto explora a
relação simbiótica entre o autor e sua obra, centrando-se na figura do francês
Marcel Proust (1871-1922), o criador da monumental série “Em busca do tempo
perdido”, em sete tomos: como um marinheiro num oceano de palavras, Proust
navega em suas páginas como um protagonista ao encalço de sentido maior para a
sua vida, de sua própria missão de escritor, ou antes, de descoberta de sua
vocação literária.
O conteúdo memorial
da obra arrasta-se até o fim, digo melhor, tanto da própria série quanto da existência
física do escritor, como se ambas fossem uma só entidade, na qual a conclusão da
primeira implicasse – como predica o vate pernambucano – um fecho “suicida”
para a segunda: a título de deslinde, tenha em mente o leitor que três dos sete
volumes da “Recherche” foram publicados postumamente.
J.A.R. – H.C.
João Cabral de Melo
Neto
(1920-1999)
Proust e seu livro
Decerto o sabia, quem
viveu
com a vida e a obra
emaranhadas,
que viveu fazendo-as,
refazendo-as,
elastecendo-a em
tempo e páginas,
que vestiu sua obra,
por dentro,
percorrendo-a,
viajando em seu barco,
decerto viu que um
dia acabá-la
era matar-se em
livro, suicidá-lo.
Em: “Museu de tudo”
(1975)
Estampa para Proust
em seu labor literário
(Autoria desconhecida)
Referência:
MELO NETO, João
Cabral. Proust e seu livro. In: __________. A educação pela pedra e depois.
1. ed. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira, 1997. p. 89.
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