Num discurso fragmentado,
o poeta inglês justapõe imagens aparentemente díspares – dor na cabeça, nuvens,
crescimento de árvores, luzes de sódio etc. –, obrigando o leitor a encetar
conexões entre elas e a conceber sua própria interpretação para o poema. Nada
obstante, penso que se poderia tomá-lo, sem erro, como um tributo ou um gesto
de compaixão e de solidariedade por aqueles que sofrem, quer se os concebam
como pessoas específicas do círculo de amizades do falante, quer os versos façam
referência, mais amplamente, a uma faceta da condição humana.
Centrados na
experiência da dor – tanto física quanto emocional (“pain” & “hurt”) –, os
versos enfatizam a urgência da conexão humana em meio ao sofrimento, para
atenuá-lo nestes tempos tão difíceis, numa demonstração de amor incondicional. Noutra
mirada, a própria natureza pode nos servir como fonte de consolo, naquilo que
externaliza as lancinantes forças subjacentes em suas erupções rumo ao
crescimento e à expansão do mundo orgânico, pelo que se pode suscitar um
paralelo à ideia de “crescer” por meio dos incidentes que nos causam sofrimento.
J.A.R. – H.C.
Jeremy H. Prynne
(n. 1936)
Against Hurt
Endowed with so much
suffering, they
should be / and that
they are so – the pain
in the head
which applies to me
and the clouds low
over
the horizon: soon it
will be dark.
We love the brief
night, for its
quick passing, the
relative ease as
we slide into comfort
and
the trees grow and
grow. I can hear
every smallest growth
the expanse is
grinding with it,
out on the flats
beyond, down by
the sodium street
lights, in the head:
pain, the hurt to
these who are all
companions. Serenity
is their slender
means.
There is not much
time
left. I love them
all, severally and in
the largest honour
that there is.
Now and with the
least hurt, this
is for you.
Dor
(Marie Padden:
artista irlandesa)
Contra a Dor
Dotadas de tanto
sofrimento, deveriam
ser / e assim
o são – a dor na
cabeça
que a mim se aplica
e as nuvens baixas
sobre
o horizonte: daqui a
pouco
estará escuro.
Encanta-nos a breve
noite, por sua
passagem célere, a
relativa facilidade
com que rolamos no
conforto, enquanto
as árvores crescem
cada vez mais.
Consigo ouvir
as mais pequenas
medras,
o rangido da expansão
que as acompanha,
o irromper para além
dos andares, junto
às luzes de sódio da
rua, dentro da cabeça:
o pesar, a dor por esses
que são todos
companheiros. A
serenidade
é um recurso que se
lhes revela escasso.
Já não resta muito
tempo. Amo-os a
todos, individualmente e com
a maior honra que
possa existir.
Agora e com o mínimo
de dor, recebam isto
como um tributo.
Referência:
PRYNNE, Jeremy H.
Agains hurt. In: __________. Poems. 2nd ed. Tarset, EN: Bloodaxe Books; Fremantle,
AU: Fremantle Arts Centre Press, 2005. p. 52.
❁
Nenhum comentário:
Postar um comentário