O poeta mexicano nos
leva a adentrar uma paisagem intimista e reflexiva, na qual a contemplação e o
questionamento entrelaçam-se num diálogo dicotômico e intrigante, mediante a
personificação da alma e a exploração de emoções contrastantes, as quais pervagam
entre o entorno natural e estados mentais de inquietude, de desassossego, provindos,
talvez, de uma intuição, um pressentimento ou suspeita que não se pode explicar
de modo racional.
Em meio a esse clima
conflitivo, em que a felicidade e a harmonia de outrora parecem ter-se dissipado,
idem o encanto, o primor, a alegria e a vitalidade, o falante recorre, de certa
maneira, a formas liminares de autodestruição para aliviar a dor que sente.
Mas nada que não possa
ser superado pela experiência da beleza, ela que nos costuma surpreender inclusive
nos momentos mais difíceis, de vazio ou de isolamento, levando-nos a esquecer da
aridez do presente, pois que a sensação de assombro que costuma despertar tem o
condão de nos reconectar à vida – na beleza graciosa das flores, no canto
mavioso dos pássaros, em algo que, tocando-nos, estimula-nos a encontrar
sentidos inauditos, até mesmo em eventos triviais, quiçá convertendo-os em
palavras, em poesias!
J.A.R. – H.C.
(1932-2009)
Sentada en el filo de nopales
Mi alma se pregunta qué pregunta.
No sé por qué se ensimisma tanto
Ni qué le arde desde tan temprano;
Quizá sea algún murmullo no visible,
O el recuerdo de un lugar
En que los pájaros ríen y las dalias también.
Ya el estío perdió su candor.
Un viento grande me blinda el oído
Y a duras penas
Cruelmente me consuelo
Dándole de palos a los nardos.
Algo sordo me cae desde la cornisa.
Por mera casualidad
Oigo otra vez
El olvidado fragor de la belleza.
Cidade dos Anjos
(Daniela Stoykova:
artista búlgara)
Sim e Não
Sentada perto dos
nopais (*)
Minh’alma se pergunta
sobre o que pergunta.
Não sei por que tanto
se ensimesma
Ou o que a faz arder
desde tão cedo;
Talvez seja algum
murmúrio não visível,
Ou a lembrança de um
lugar
Em que riem os
pássaros como as dálias.
O verão já perdeu o
seu candor.
Um grande vento
blinda-me os ouvidos
E a duras penas
Cruelmente me consolo
Sovando os nardos com
paus.
Da cornija algo surdo
cai sobre mim.
Por mero acaso
Ouço outra vez
O esquecido fragor da
beleza.
Nota:
(*) Nopais: plantas
da família das cactáceas, de frutos comestíveis e flores vermelhas, bastante
encontradiças no México.
Referência:
OCA, Marco Antonio
Montes de. Sí y no. In: DEBICKI, Andrew P. (Selección, introducción,
comentarios y notas). Antología de la poesía mexicana moderna. London,
EN: Támesis Books, 1977. p. 267. (Colección ‘Támesis’; Serie B - Textos, XX)
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