Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 20 de fevereiro de 2024

Maya Angelou - Uma Ousada e Surpreendente Verdade

Redigido em 1995 para comemorar o quinquagésimo aniversário da Organização das Nações Unidas (ONU), este poema de Angelou retrata o seu otimismo em relação à humanidade, a despeito das atrocidades que derivam de muitas de nossas ações predatórias, vezes sem conta abstraídas a quaisquer justificações éticas.

 

Nem demônios nem anjos: incorremos nos horrores da guerra, nas desvirtudes de uma religião corrompida por interesses outros que não os da dignificação da alma, na devastação do meio ambiente, em hostilidades, ódios, brutalidades, embora tenhamos o potencial para criar um mundo pacífico, pautado na esperança, na verdade, na justiça. O que nos falta?!

 

J.A.R. – H.C.

 

Maya Angelou

(1928-2014)

 

A Brave and Startling Truth

 

Dedicatet to the hope for peace, wich lies,

sometimes hidden, in every heart

 

We, this people, on a small and lonely planet

Traveling through casual space

Past aloof stars, across the way of indifferent suns

To a destination where all signs tell us

It is possible and imperative that we learn

A brave and startling truth

 

And when we come to it

To the day of peacemaking

When we release our fingers

From fists of hostility

And allow the pure air to cool our palms

 

When we come to it

When the curtain falls on the minstrel show of hate

And faces sooted with scorn are scrubbed clean

When battlefields and coliseum

No longer rake our unique and particular sons and daughters

Up with the bruised and bloody grass

To lie in identical plots in foreign soil

 

When the rapacious storming of the churches

The screaming racket in the temples have ceased

When the pennants are waving gaily

When the banners of the world tremble

Stoutly in the good, clean breeze

 

When we come to it

When we let the rifles fall from our shoulders

And children dress their dolls in flags of truce

When land mines of death have been removed

And the aged can walk into evenings of peace

When religious ritual is not perfumed

By the incense of burning flesh

And childhood dreams are not kicked awake

By nightmares of abuse

 

When we come to it

Then we will confess that not the Pyramids

With their stones set in mysterious perfection

Nor the Gardens of Babylon

Hanging as eternal beauty

In our collective memory

Not the Grand Canyon

Kindled into delicious color

By Western sunsets

 

Nor the Danube, flowing its blue soul into Europe

Not the sacred peak of Mount Fuji

Stretching to the Rising Sun

Neither Father Amazon nor Mother Mississippi who, without favor,

Nurture all creatures in the depths and on the shores

These are not the only wonders of the world

 

When we come to it

We, this people, on this minuscule and kithless globe

Who reach daily for the bomb, the blade and the dagger

Yet who petition in the dark for tokens of peace

We, this people on this mote of matter

In whose mouths abide cankerous words

Which challenge our very existence

Yet out of those same mouths

Come songs of such exquisite sweetness

That the heart falters in its labor

And the body is quieted into awe

 

We, this people, on this small and drifting planet

Whose hands can strike with such abandon

That in a twinkling, life is sapped from the living

Yet those same hands can touch with such healing, irresistible tenderness

That the haughty neck is happy to bow

And the proud back is glad to bend

Out of such chaos, of such contradiction

We learn that we are neither devils nor divines

 

When we come to it

We, this people, on this wayward, floating body

Created on this earth, of this earth

Have the power to fashion for this earth

A climate where every man and every woman

Can live freely without sanctimonious piety

Without crippling fear

 

When we come to it

We must confess that we are the possible

We are the miraculous, the true wonder of this world

That is when, and only when

We come to it.

 

Campo de trigo com sol nascente

(Vincent van Gogh: pintor holandês)

 

Uma Ousada e Surpreendente Verdade

 

Dedicado à esperança de paz, que jaz,

por vezes escondida, em cada coração

 

Nós, este povo, em um planeta pequeno e solitário

Estamos casualmente em viagem pelo espaço

Entre estrelas distantes, ao longo da órbita de sóis indiferentes

Até um destino onde todos os sinais nos afirmam

Que é possível e imperativo que assimilemos

Uma ousada e surpreendente verdade

 

E quando lá chegarmos

Ao dia da pacificação

Quando distendermos nossos dedos

Dos punhos da hostilidade

E permitirmos que o ar puro arrefeça nossas palmas

 

Quando lá chegarmos

Quando a cortina cair sobre o espetáculo dos menestréis do ódio

E os rostos enfarruscados de escárnio forem rostidos e limpos

Quando os campos de batalha e o coliseu

Deixarem de arrebatar nossos filhos e filhas únicos e exclusivos

Junto com a grama calcada e ensanguentada

Para inumá-los em covas idênticas em solo estrangeiro

 

Quando a investida predatória das igrejas

E o alarido vociferante nos templos houverem cessado

Quando as flâmulas ondularem galhardamente

Quando os estandartes do mundo tremularem com vigor

Ao sabor de uma brisa pura e benfazeja

 

Quando lá chegarmos

Quando deixarmos cair os rifles de nossos ombros

E as crianças vestirem suas bonecas com as bandeiras da trégua

Quando as mortíferas minas terrestres forem removidas

E os idosos puderem caminhar em noites de paz

Quando os rituais religiosos não estiverem impregnados

Por incenso de carne queimada

E os sonhos da infância não forem destroçados

Pelos pesadelos do abuso

 

Quando lá chegarmos

Então admitiremos que nem as Pirâmides

Com suas pedras engastadas em misteriosa perfeição

Nem os Jardins da Babilônia

Suspensos ao status de eterna beleza

Em nossa memória coletiva

Tampouco o Grand Canyon

Iluminado com deliciosas cores

Pelos pores do sol do Oeste

 

Nem o Danúbio, a verter sua alma azul pela Europa

Nem o pico sagrado do Monte Fuji

Que se estende até o Sol Nascente

Tampouco o Pai Amazonas ou a Mãe Mississipi que, sem distinção,

Nutrem todas as criaturas em suas profundezas e margens

São as únicas maravilhas do mundo

 

Quando lá chegarmos

Nós, este povo, neste minúsculo e desirmanado globo

Que diariamente lança mão de bombas, lâminas e adagas

E que, ainda assim, vindica sinais de paz na escuridão

Nós, este povo neste grânulo de matéria

Cujas bocas teimam em perpetuar palavras devastadoras

Que lançam reptos à nossa própria existência

Haveremos de perceber que dessas mesmas bocas

Podem sair canções de tão requintada doçura

Capazes de fazer o coração fraquejar em sua lida

E o corpo se aquietar em reverência

 

Nós, este povo, neste pequeno planeta à deriva

Cujas mãos são capazes de atacar com tal impetuosidade

Que, num piscar de olhos, a vida de qualquer criatura pode ser retirada

Mãos que, no entanto, também podem tocar com uma ternura

tão curativa e irresistível

Que o colo altivo logo se compraz em submeter-se

E as costas orgulhosas se contentam em curvar-se

Haveremos de deduzir de tal caos, de tal contradição

Que não somos nem anjos nem demônios

 

Quando lá chegarmos

Nós, este povo, neste corpo flutuante e voluntarioso

Criado nesta terra, por esta terra

Compreenderemos que temos o poder de sobre ela modelar

Um ambiente em que cada homem e cada mulher

Possam viver livremente sem fingida piedade

Sem medos paralisantes

 

Quando lá chegarmos

Haveremos de admitir que somos a possível

Que somos a miraculosa, a verdadeira maravilha deste mundo

Quando e somente quando

Lá chegarmos.

 

Referência:

 

ANGELOU, Maya. A brave and startling truth. In: __________. Celebrations: rituals of peace and prayer. 1st ed. New York, NY: Random House, 2006. p. 17-23.

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