Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Francisco Brines - A fabulosa eternidade

Como um homem que se aproxima da derradeira curva da vida, o falante – recordando as imagens que lhe ficaram na mente por conta das vicissitudes pelas quais passou, seus amores, momentos felizes e ilusões –, vê nesse átimo fugaz o sopro de eternidade a perpassar o sonho em que envolta toda a precária existência humana.

 

As imagens evocadas pelo poeta configuram metáforas inequívocas para uma síntese pictórica epilogal: sons, cores, odores e miradas panorâmicas, sinais de um tempo mortiço a prenunciar metamorfoses nos contentores de uma ampulheta a converter os tardios anelos de um corpo – ainda sedento por mais luzes nesse pomar outonal – a um outro sentido de presença, no qual o tempo não se estima por meros dias, meses ou anos.

 

J.A.R. – H.C.

 

Francisco Brines

(1932-2021)

 

La fabulosa eternidad

 

Es rosa el monte tras el mudo huerto

del otoño. Los pájaros confunden

ramas, vuelos y trinos; y en el mar

se adormecen las velas solitarias.

Cuelgan de las palmeras los dorados

racimos, y los aires vienen breves

a golpear las ramas del naranjo.

Un aroma de tardíos jazmines

da a mi carne vigor, y juventud.

Los rosales son zarzas y son fuego:

se desnudan de olor. Y son sus flores

sangrientas, blancas, rosas, amarillas.

La casa esplende bajo el sol tardío;

el tiempo es una luz ya muy cansada.

 

Puntean las estrellas, y algún frío

baja el azul; es hosca la llegada

de los cuervos que baten el pinar.

Aquí, en este lugar, supo mi infancia

que era eterna la vida, y el engaño

da a mis ojos amor. Hoy miro el mundo

como el amante sabe, abandonado,

que quien le desdeñó le merecía.

Y todo pudo ser, pues fue vivido,

y este rumor de tiempo que yo soy

recuerda, como un sueño, que fue eterno.

 

En: “El otoño de las rosas” (1986)

 

Eternidade

(Teresa Gimenez: pintora espanhola)

 

A fabulosa eternidade

 

É róseo o monte por trás do mudo pomar

do outono. Os pássaros confundem

ramos, voos e trinados; e no mar

adormecem as velas solitárias.

Pendem das palmeiras os dourados

racemos, e as aragens vêm breves

para fustigar os ramos da laranjeira.

Um aroma de tardios jasmins

dá à minha carne vigor, e juventude.

Os roseirais são sarças e são fogo:

despojam-se de fragrância. E suas flores são

sangrentas, brancas, róseas, amarelas.

A casa esplende sob o sol tardio;

o tempo é uma luz já muito cansada.

 

Pontilham as estrelas, e algum frio

o azul faz descer; é soturna a chegada

dos corvos que batem no pinhal.

Aqui, neste lugar, soube minha infância

que era eterna a vida, e o ilusório revela

o amor aos meus olhos. Hoje vejo o mundo

como o amante sabe, abandonado,

tal como quem o desdenhou o merecia.

E tudo pôde ser, pois foi vivido,

e este rumor de tempo que eu sou

recorda, como um sonho, que foi eterno.

 

Em: “O outono das rosas” (1986)

 

Referência:

 

BRINES, Francisco. La fabulosa eternidad. In: ORTEGA, Julio (Ed.). Los 100 grandes poemas de España y América. 1. ed. México, D.F.: Siglo XXI Editores, 2000. p. 334.

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