Não é sobre uma queda
propriamente física, exposta às leis da gravidade universal, que o poeta se põe
a lançar versos, senão sobre uma “queda interior”, de um homem tenso e com medo,
no momento mesmo em que as ponderações do coração ficam em suspenso e se luta
uma guerra perversa entre duas partes de um mesmo domínio, com a consequente
dilaceração psicológica, em completo descaso sobre o que restará de si mesmo.
Uma “queda livre” que
se assemelha a incursões ao redemoinho dos infernos, metáfora provável para
todas as dúvidas que opõem o homem aos seus desígnios de ascensão, de mutação
interior, para viver uma vida compatível com as suas potencialidades, mantendo estável
a dinâmica do voo, vale dizer, sem sabotagens de seus dois pilotos internos:
razão e emoção.
J.A.R. – H.C.
Mário Chamie
(1933-2011)
Queda Interior
Se a queda é livre
o medo da queda
é preso.
Livre é a queda
sem embaraço
defeso.
A queda
de um homem
tenso
não é a guerra
do Peloponeso
pelo estreito
de um coração
perverso.
A queda
livre
é o próprio peso
de um coração
suspenso.
Toda queda
é o menosprezo
de quem cai
sobre si mesmo.
Queda Livre
(Paula Roselló:
artista espanhola)
Referência:
CHAMIE, Mário. Queda
interior. In: RODRIGUES, Claufe; MAIA, Alexandra (Orgs.). 100 anos de
poesia: um panorama da poesia brasileira do século XX. Vol. II. Rio de
Janeiro, RJ: O Verso Edições, 2001. p. 40.
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