A alma do homem,
segundo Goethe, se parece à água, naquilo que ela tem de fluida, de impermanente,
indo e vindo ao sabor do tempo: de Deus provém e a ele voltará um dia. A ideia
de fluxo também é por ele empregada para aclarar o que seja o destino humano, enquanto
vento com poder para empurrar as águas a pontos revoltos ou bonançosos.
Vontades que se
despedaçam contra penhascos, arroubos que vão de encontro a forças de um
destino nem sempre condescendente, a vida humana é bem essa corrente entre
paixões tempestuosas e estados tranquilos, um caminhar irretornável do pico ao
vale, até que, por fim, uma passagem se abre entre as cidades de baixo e de
cima.
J.A.R. – H.C.
J. W. Goethe
Detalhe de Retrato
por Angelica Kauffmann
(1749-1832)
Gesang der Geister
über den Wassern
Des Menschen Seele
Gleicht dem Wasser:
Vom Himmel kommt es,
Zum Himmel steigt es,
Und wieder nieder
Zur Erde muss es,
Ewig wechselnd.
Strömt von der hohen,
Steilen Felswand
Der reine Strahl,
Dann stäubt er
lieblich
In Wolkenwellen
Zum glatten Fels,
Und leicht empfangen
Wallt er
verschleiernd,
Leisrauschend
Zur Tiefe nieder.
Ragen Klippen
Dem Sturz entgegen,
Schäumt er unmutig
Stufenweise
Zum Abgrund.
Im flachen Bette
Schleicht er das
Wiesental hin,
Und in dem glatten
See
Weiden ihr Antlitz
Alle Gestirne.
Wind ist der Welle
Lieblicher Buhler;
Wind mischt vom Grund
aus
Schäumende Wogen.
Seele des Menschen,
Wie gleichst du dem
Wasser!
Schicksal des
Menschen,
Wie gleichst du dem
Wind!
O homem pensante
(Ang Kiukok: pintor
filipino)
Canto dos Espíritos
sobre as Águas
A alma do homem
É como a água:
Do céu vem,
Ao céu sobe,
E de novo tem
Que descer à terra,
Em mudança eterna.
Corre do alto
Rochedo a pino
O veio puro,
Então em belo
Pó de ondas de névoa
Desce à rocha lisa,
E acolhido de manso
Vai, tudo velando,
Em baixo murmúrio.
Lá para as profundas.
Erguem-se penhascos
De encontro à queda,
– Vai, ’spumando em
raiva,
Degrau em degrau
Para o abismo.
No leito baixo
Desliza ao longo do
vale relvado,
E no lago manso
Pascem seu rosto
Os astros todos.
Vento é da vaga
O belo amante;
Vento mistura do
fundo ao cimo
Ondas ’spumantes.
Alma do Homem,
És bem como a água!
Destino do homem,
És bem como o vento!
Referência:
GEOTHE, J. W. Gesang
der geister über den wassern / Canto dos espíritos sobre as águas. Tradução de
Paulo Quintela. In: __________. Poemas. Antologia, versão portuguesa,
notas e comentários de Paulo Quintela; 4. ed. Coimbra: Centelha – Promoção do
Livro, SARL, 1986. Em alemão: p. 36 e 38; em português: p. 37 e 39. (Poesia /
Autores Universais – 1)
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