Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 9 de junho de 2021

Rumi - Quando eu morrer

Em meio à grave situação em que imerso o país, num descontrole sanitário em razão da pandemia por covid-19 – para a qual muito contribuiu, de modo determinante, o comportamento omissivo e nefasto do Governo Federal, sobretudo do presidente eleito –, como não relembrar os amigos, colegas e conhecidos que sucumbiram sob os terríveis efeitos provocados pela doença?

É a presença da morte, tão por perto, que nos deixa com o espírito soturno, quase nos fazendo perder o ânimo de viver. E para reverter tal situação, nada melhor que um poema com um tom de esperança e de confiança no espírito humano redivivo, quaisquer que sejam as contingências de momento, assim como tão bem se insculpe nestas memoráveis linhas do sufista persa.

J.A.R. – H.C.

 

Jalal ud-Din Rumi

(1207-1273)

 

When I die

 

When I die,

when my coffin

is being taken out,

you must never think

I am missing this world.

 

Don’t shed any tears,

don’t lament or

feel sorry,

I’m not falling

into a monster’s abyss.

 

When you see

my corpse is being carried,

don’t cry for my leaving;

I’m not leaving,

I’m arriving at eternal love.

 

When you leave me

in the grave,

don’t say goodbye.

Remember a grave is

only a curtain

for the paradise behind.

 

You’ll only see me

descending into a grave.

Now watch me rise;

how can there be an end

when the sun sets or

the moon goes down?

 

It looks like the end

it seems like a sunset,

but in reality it is a dawn

when the grave locks you up

that is when your soul is freed.

 

Have you ever seen

a seed fallen to earth

not rise with a new life?

Why should you doubt the rise

of a seed named human?

 

Have you ever seen

a bucket lowered into a well

coming back empty?

Why lament for a soul

when it can come back

like Joseph from the well.

 

When for the last time

you close your mouth,

your words and soul

will belong to the world of

no place no time.

 

Alegoria da morte e o homem rico

(Frans Francken III: pintor flamengo)

 

Quando eu morrer

 

Quando eu morrer

e meu esquife

estiver sendo levado para fora,

jamais deverás pensar que

estarei sentindo falta deste mundo.

 

Não derrames quaisquer lágrimas,

não lamentes

ou compadeças-te de mim,

pois não estarei caindo

no abismo de um monstro.

 

Quando vires

meus despojos sendo carregados,

não chores por minha partida,

pois não estarei partindo,

senão chegando ao amor eterno.

 

Quando te ausentares

de meu jazigo,

não digas adeus.

Lembra-te de que um jazigo é

apenas um véu

com o paraíso por trás.

 

Apenas me verás

descendo à tumba.

E logo me verás a subir:

como pode haver um fim

quando o sol ou a lua

se põem?

 

Isso parece o fim,

semelha-se ao pôr do sol,

mas na realidade é um amanhecer;

o instante em que te fecham na tumba

é o momento em que tua alma se liberta.

 

Já viste alguma vez

uma semente caída na terra

não abrolhar em uma nova vida?

Por que hás de duvidar do germinar

de uma semente em forma humana?

 

Alguma vez chegaste a ver

um balde baixar em um poço

e retornar vazio?

Por que lamentar-se por uma alma

quando se pode regressar, como José,

desde o poço em que se foi atirado?

 

Quando pela derradeira vez

fechares a tua boca,

tuas palavras e tua alma pertencerão

ao mundo que não mais se sujeita

às leis do espaço e do tempo.


Referência:

RUMI, Jalal ud-Din. When I die. Translated from Persian to English by Nader Khalili. In: __________. The spiritual poems of Rumi. 2nd publ. Translated by Nader Khalili. New York, NY: Wellfleet Press, 2020. p. 62-63.

2 comentários:

  1. Extremamente profundo, muito inspirador!

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    1. Certamente, prezado(a):
      Os poemas de Rumi, repletos de um pendor místico, são capazes de nos levar a um estado de enlevo espiritual.
      João A. Rodrigues

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