Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

terça-feira, 22 de junho de 2021

Luís Miguel Nava - O Poema

O poema sobre a página desencadeia uma série de imagens – plasmadas em claridade, transparência e brancura – por meio das quais o poeta procura caracterizar a sua escrita: uma pedra caindo no ventre da água, como um punho, encarcerado em sua própria estampa.

Alguns elementos em dissonância ou dubiedade – como “fruta poderosa” e “força miúda”, assim como o incógnito “a” entre “leão íris” e “atravessa”, parecendo reverberar, de volta, à “força miúda” (ou seria à pedra?) – desencadeiam no leitor a impressão de que os reais sentidos, entranhados nesse construto metalinguístico, estejam para além de uma compreensão meramente lógica, remanescendo enigmáticos sob o prazer estético que emana do sugestivo aparato vocabular empregado pelo autor.

J.A.R. – H.C.

 

Luís Miguel Nava

(1957-1995)

 

O Poema

 

É um arbusto, armados

ainda nele os últimos relâmpagos,

o poema.

 

A pedra cai no ventre

da água – a fruta poderosa, as páginas

onde a brancura se estilhaça, o lenço

como um relâmpago.

 

Os cães brilham ao alto

– são eles o arbusto

de imagens onde a força miúda

como um leão íris

a atravessa o poema encarcerado em sua própria

imagem.

 

A pedra, digo, cai no ventre

da água como um punho

 

– agora está no fundo desta imagem.

 

Em: “Poemas” (1987)

 

Paisagem com arco-íris

(Peter Paul Rubens: pintor flamengo)


Referência:

NAVA, Luís Miguel. O poema. In: CASTRO, Mario Moraes (Selección y Traducción). Antología breve de la poesía portuguesa del siglo XX. Edición bilingüe: Portugués x Español. 1. ed. México, DF: Instituto Politécnico Nacional, ene. 1998. p. 362.

Nenhum comentário:

Postar um comentário