As imagens suscitadas pelos versos deste poema de Bolaño levam-nos a associá-las a algum instante do Medievo, quando os senhores de terra detinham castelos e os protegiam com alambrados ou outras vedações, para que se lhes fossem prestados tributos.
Ouve-se a voz lírica de um monge que, depois de descansar de algumas caçadas, pôs-se a procurar pelo seu senhor, que havia avançado até um ponto por todos ignorado, quando, então, teve ciência de que alguém – seria ele próprio? – havia dormido por longo tempo sobre os seus escritos.
Sob um artificial calor dos crepúsculos, o monge, mais parecendo um cavaleiro andante ou guerreiro, percebe, de fato, que muitas virtuais obras sobre suas aventuras deixaram de ser difundidas, daí porque não se pode sentir a calidez de uma missão cumprida ao figurado arrebol da vida.
J.A.R. – H.C.
Roberto Bolaño
(1953-2003)
El monje
Fui feliz durante las cacerías.
Dormité a la sombra de un plátano.
Los sueños ordenaban ríos y castillos.
Al alba mi hermano me murmuró al oído
que tras esas colinas los dominios
permanecían con las mismas alambradas.
Homenajes – dijo. Cabalgué
hasta alcanzar a la vanguardia.
Nadie supo indicarme hacia dónde
se había marchado nuestro señor.
Intuí que el calor de los crepúsculos
era artificial. Supe que alguien
largo tiempo había dormido
sobre mis escritos.
Monge cartuxo
(Charles-Caïus Renoux: pintor francês)
O monge
Fui feliz durante as caçadas.
Dormitei à sombra de um plátano.
Os sonhos punham em ordem rios e castelos.
Ao amanhecer, meu irmão sussurrou-me ao ouvido
que, por trás daquelas colinas, os domínios
permaneciam com os mesmos alambrados.
Homenagens – disse-me ele. Cavalguei
até chegar à vanguarda.
Ninguém soube indicar-me até onde
havia avançado o nosso senhor.
Intuí que o calor dos crepúsculos
era artificial. Soube que alguém
por um longo tempo havia dormido
sobre os meus escritos.
Referência:
BOLAÑO, Roberto. El monje. In:
__________. Poesía reunida. Prólogo de Manuel Vilas. 1. ed. Madrid, ES:
Alfaguara, 2018. p. 54.
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