Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 10 de junho de 2020

Jorge Luis Borges - Édipo e o Enigma

Neste soneto, o primeiro quarteto diz respeito diretamente ao enigma proposto pela esfinge a Édipo: logo após nascer – a aurora da vida –, a criança caminha com os quatro membros no chão, enquanto está aprendendo a andar, com dois na idade adulta e, ao cair da tarde – ao adentrar a velhice –, apoia-se numa cajado ou bengala, pois as pernas já não são capazes de manter o ser humano em pé, com firmeza.

E é nesse avançar da idade que se concentra Borges, ao nos desvendar a todos como um Édipo, em seu declínio e trágico destino – aqui deduzido do enredo da peça “Édipo-Rei”, de Sófocles –, mais ainda, como uma “tripla besta” – criança, adulto e velho –, a quem Deus, por piedade, concede o beneplácito de sucessão (seria um escárnio Borges não ter deixado filhos?!), em parelha ao mais silente esquecimento.

J.A.R. – H.C.

Jorge Luis Borges
(1899-1986)

Edipo y el Enigma

Cuadrúpedo en la aurora, alto en el día
y con tres pies errando por en vano
ámbito de la tarde, así veía
la eterna esfinge a su inconstante hermano,

el hombre, y con la tarde un hombre vino
que descifró aterrado en el espejo
de la monstruosa imagen, el reflejo
de su declinación y su destino.

Somos Edipo y de un eterno modo
la larga y triple bestia somos, todo
lo que seremos y lo que hemos sido.

Nos aniquilaría ver la ingente
forma de nuestro ser; piadosamente
Dios nos depara sucesión y olvido. 

Édipo e a Esfinge
(Jean-Auguste D. Ingres: pintor francês)

Édipo e o Enigma

Quadrúpede na aurora, alto no dia
e com três pés errando pelo vão
território da tarde, é como via
a eterna esfinge o inconstante irmão,

o homem, e com a tarde um homem veio
que decifrou aterrado no espelho
da monstruosa imagem, o reflexo
de sua declinação e seu destino.

Somos Édipo e de um eterno modo
a longa e tripla besta somos, tudo
o que seremos mais o que já fomos.

Aniquilar-nos-ia ver a ingente
forma de nosso ser; piedosamente
Deus nos concede sucessão e olvido.

Referência:

BORGES, Jorge Luis. Edipo y el enigma / Édipo e o enigma. Tradução de Heloisa Jahn. In: __________. Nova antologia pessoal. 1 ed. Traduções de Davi Arrigucci Jr., Heloisa Jahn e Josely Vianna Baptista. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. Em espanhol: p. 311; em português: p. 47.

Nenhum comentário:

Postar um comentário