Por meio da palavra escrita na folha em branco – óbvio está que o leitor
há de assimilar a expressão de modo atualizado aos dias que correm, haja vista os
softwares para digitação de textos em desktops e notebooks –, o poeta aspira a
um “sonho de eternidade”, para que, depois de haver partido, se possa ainda ouvir
o seu “sopro entre os plátanos”.
Pois é na palavra – fonte de riso, tristeza, sonho e amor – que, a
qualquer tempo, palpita a “pele abstrata” do corpo que a concebeu – esteja ele
vivo ou não –, não se restringindo o sentido de posse ao emitente original, mas
a todos que com ela entrem em contato: se na estática da palavra impressa há
algo como a morte, no peso do pensamento ou do sentimento há dinâmica
suficiente para fazê-la arrancar voo e perpetuar-se.
J.A.R. – H.C.
Armindo Trevisan
(n. 1933)
Elogio do Papel
Sobre o papel poroso
ressuscito
a brancura do nada:
eis a palavra.
Dela brota a
tristeza, o riso, o sonho,
e o amor que agita os
peixes nos abismos.
Sobre o papel palpita
a pele abstrata
do corpo que não
tenho, e é de todos:
um único destino
feito história,
sonho de eternidade
que nos honra.
Escreve, filho, sobre
a folha em branco!
Com letras mortas
grava ali teu voo.
Quando partires,
mesmo estando vivo,
ressoará teu sopro
entre os plátanos.
Em: “A Serpente na Grama” (2001)
Os Grandes Plátanos
(Vincent van Gogh:
pintor holandês)
Referência:
TREVISAN, Armindo. Elogio do papel. In:
__________. Nova antologia poética:
1967-2001. Porto Alegre, RS: Sulina, 2001. p. 195.
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