Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 18 de abril de 2020

Emily Dickinson - Invejo os mares, onde ele navega

O teor deste poema de Dickinson tem algo de ambivalente: tanto pode ser lido (i) como direcionado a um pretendente – talvez a leitura mais precisa –, de quem ela teria inveja de tudo ao seu redor, dos mares onde navega, das carruagens, das colinas que o observam passar, das corruíras, da mosca que pousa em sua vidraça e até das ramagens, (ii) bem assim como uma espécie de canto religioso, dedicado ao amor de Deus e às belezas por Ele criadas, dadas as menções aos céus e ao anjo Gabriel.

A alusão aos brincos do conquistador espanhol Francisco Pizarro (1478-1541) – que entrou para a História como quem submeteu o Império Inca ao poderio de seu país – não deixa de provocar no leitor certa perplexidade, dada a própria matéria que conforma o poema – designadamente, o amor, mesmo que velado –, em plena oposição ao contexto nada cordial da conquista de terras peruanas por forças arregimentadas pelo espanhol.

J.A.R. – H.C.

Emily Dickinson
(1830-1886)

I envy Seas, whereon He rides

I envy Seas, whereon He rides –
I envy Spokes of Wheels
Of Chariots, that Him convey –
I envy Crooked Hills

That gaze upon His journey –
How easy All can see
What is forbidden utterly
As Heaven – unto me!

I envy Nests of Sparrows –
That dot His distant Eaves –
The wealthy Fly, upon His Pane –
The happy – happy Leaves –

That just abroad His Window
Have Summer’s leave to play –
The Ear Rings of Pizarro
Could not obtain for me –

I envy Light – that wakes Him –
And Bells – that boldly ring
To tell Him it is Noon, abroad –
Myself – be Noon to Him –

Yet interdict – my Blossom –
And abrogate – my Bee –
Lest Noon in Everlasting Night –
Drop Gabriel – and Me –

O anjo sobre o mar Egeu
(Ksenia Yarovaya: pintora grega)

Invejo os mares, onde ele navega

Invejo os mares, onde ele navega –
Invejo as rodas e os aros
Das carruagens, que o levam –
Invejo as colinas encurvadas

De sua jornada, testemunhas –
Todas as coisas podem mirar
O que me é proibido
Como o céu, que me é fechado!

Invejo os ninhos das corruíras,
Que pontuam seus distantes beirais –
Em sua vidraça, a opulenta mosca –
As tão felizes ramagens,

Que frente à sua janela
Têm permissão do estio para brincar –
O que nem os brincos de Pizarro
Poderiam me proporcionar.

Invejo a luz, que o desperta
E os sinos que soam irreverentes
E lhe dizem que, além, a meio vai o dia –
Mas que o seu meio-dia sou eu;

Interdita, porém, é minha florada
E se aniquila a minha abelha –
Para que o dia pleno não precipite
A mim e a meu anjo em noite eterna.

Referência:

DICKINSON, Emily. I envy seas, whereon he rides / Invejo os mares, onde ele navega. Tradução de Ivo Bender. In: __________. Poemas Escolhidos. Seleção, tradução e introdução de Ivo Bender. Edição bilíngue. Porto Alegre, RS: L&PM, 2011. Em inglês: p. 72 e 74; em português: p. 73 e 75. (Coleção L&PM Pocket; v. 436)

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