Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 8 de abril de 2020

Alberto João - Impressões de uma cidade do interior

Uma cena bem plausível de ter acontecido em algumas cidades do interior do país, especialmente há algumas décadas – pois nos dias que correm as coisas já estão para lá de avançadas e ninguém, absolutamente, deixa de saber o que se passa na ordem do dia, aqui como no outro lado do planeta, quase em tempo real.

Mas há certa morosidade no correr do tempo, em meio às ruelas e praças principais de cidadezinhas perdidas deste imenso torrão, antes como agora, que não deixa apagar determinados ranços de coronelismo, por parte dos que, de um jeito ou de outro, acabam por assenhorear-se do poder constituído, para fazer valer as suas próprias vontades – e não as do povo, conforme se depreende da Carta Magna de Pindorama.

J.A.R. – H.C.

Vista de uma pequena
praça da cidade
(Jan van der Heyden: pintor holandês)

Impressões de uma cidade do interior

Aos domingos
há várias missas.
Os homens bem colocados
vão a todas elas
e ficam à porta da igreja
falando de bois.
As mocinhas expõem suas roupas
e movem os lábios
observando as roupas
das outras mocinhas.
O padre ataca o espiritismo
e o comunismo.
Ninguém sabe o que isso é,
mas o padre ensina.
Na hora da elevação do santíssimo
o irmão continua elevando
a saquinha santinha
pelas obras da matriz.
A última moda é véu de nylon,
todas usam.
As velhas beatas ainda usam véus de crochet
atrasadonas.
Terminou a missa,
Deus está contente.
Saem todos confortados, confessados, comungados,
limpos, completamente
preparados
para pecar.

A cidade de Dordrecht
(Eugène Boudin: pintor francês)

Referência:

JOÃO, Alberto. Impressões de uma cidade do interior. In: SANT’ANNA, Affonso Romano de et al. Violão de rua. V. II. Rio de Janeiro, GB: Civilização Brasileira, 1962. p. 20. (“Cadernos do Povo Brasileiro”; Volume Extra)

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