Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Schin Schalom - Meia-Noite

Um poema que retrata a dor dos judeus que foram perseguidos, pilhados e mortos durante a 2GM, metaforizada numa rua deserta à meia-noite, um lugar soturnamente silencioso, onde as ações dos “bárbaros” se multiplicam para disseminar horrores.

Muitos houve quem, diante de tanto sofrimento, preferissem a morte, porque infelizes se tornaram, sobrevivendo, tendo que suportar as indeléveis memórias do infortúnio: a capacidade do homem para perpetrar o mal parece ser tão fecunda que, por vezes, pode-se pensar que supera a sua vocação para promover o bem.

J.A.R. – H.C.

Schin Schalom
(1904-1990)

Meia-Noite

A noite cala-se,
Estou de pé na longa rua deserta
e grito.
Grito.
Porque em algum lugar afiam facas
porque em algum lugar assassinaram criaturas.
Porque o mal se espalha no mundo,
porque não há mais limite para pilhagem, a miséria, a dor.
Grito.
Porque a noite se cala,
a noite cala-se.
Levanto meu punho
contra as janelas apagadas, as próximas e as distantes,
e bato.
Bato –
porque os corações dormem lá dentro,
porque fora galopam os Bárbaros
para exterminar e aniquilar
geração sobre geração,
o salvador e o oprimido,
a escravidão e a liberdade –
sangue!
Levantai-vos, ó embriagados pelo abraço da besta,
celebro hoje os funerais
do homem.
Rastejo e caminho de quatro pés,
enterro as unhas no chão
e escavo.
Escavo –
talvez venha a descobrir a consciência do mundo.
Talvez os mortos elevem sua voz.
Escavo
um túmulo para a minha carne perecível,
um túmulo para a minha voz que se revolta e esbraveja,
e grito –
E a noite cala-se.
A noite cala-se.

O Grito
(Edvard Munch: pintor norueguês)

Referência:

SCHALOM, Schin. Meia-noite. Tradução de Cecília Meireles. In: GUINSBURG, J.; TAVARES, Zulmira Ribeiro (Orgs.). Quatro mil anos de poesia. Desenhos de Paulina Rabinovich. São Paulo, SP: Perspectiva, 1960. p. 266. (Coleção “Judaica”; v. 12)

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