É a poetisa que se autodescreve em seu poema, em versos que nos dão
ciência do resultado da transformação que alimentou por toda a vida, até que o
ovo da serpente rompesse a casca, demolindo-lhe a casa, devorando-a, ingratamente,
com os seus poemas de vanguarda.
Pode-se conjecturar que o ofício da poesia, nesse ínterim, ganhou precedência
frente aos outros papéis desempenhados por Laura na sociedade. E, embora, de
início, ela mencione formas fixas de manifestação do fazer poético,
apresenta-nos o efeito da antropofagia a que se submetera, mediante um poema já
tangenciando a raia das criações desgarradas.
J.A.R. – H.C.
Laura Esteves
(n. 1938)
Antropofagia
Foi tão de repente!
Nem desconfiavas
que possuías
uma poeta em casa.
Igual ao ovo da
serpente
ela foi criando vida
e forma.
Cresceu.
Deste a ela calor e
alimento.
Escondida, a poeta
escrevia
trovas, haicais e
sonetos.
Certo dia, rompeu a
casca,
derrubou a própria
casa
e, ingrata, te
devorou...
com seus poemas
de vanguarda.
Mulher lendo – A esposa do artista
(Aaron Shikler:
pintor norte-americano)
Referência:
ESTEVES, Laura. Antropofagia. In:
__________. 50 poemas escolhidos pelo
autor. Rio de Janeiro, RJ: Edições Galo Branco, 2008. p. 13. (Coleção ‘50
poemas escolhidos pelo autor’; v. 34)
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