Provavelmente escrito no curso da 2GM, Kunitz enfatiza, neste poema, os
horrores na Europa provocados pelo genocídio de Hitler, precipitando uma
jornada imaginária ao tempo dos pogrons que levaram os seus pais a se deslocar
da Rússia em direção à América.
O ato banal de se aguardar por correspondências vindas pelo correio tem,
assim, um meditativo – embora explícito – sentido político: deplora o poeta,
por meio de um elenco sinistro de detalhes, essa cidadania de um novo estado. E
pergunta-se: “Como vamos desfazer essa energia sem lei?”. Presume-se que não
haja resposta, uma vez que deus foi arrancado às máquinas, e não há deus ‘ex
machina’ que possa vir em amparo.
J.A.R. – H.C.
Stanley Kunitz
(1905-2006)
Reflection by a Mailbox
When I stand in the
center of that man’s madness,
Deep in his trauma,
as in the crater of a wound,
My ancestors step
from my American bones.
There’s mother in a
woven shawl, and that,
No doubt, is father
picking up his Pack
For the return voyage
through those dreadful years
Into the winter of
the raging eye.
One generation past,
two days by plane away,
My house is
dispossessed, my friends dispersed,
My teeth and pride
knocked in, my people game
For the hunters of
man-skins in the warrens of Europe,
The impossible
creatures of an hysteriac’s dream
Advancing with hatchets
sunk into their skulls
To rip the god out of
the machine.
Are these the
citizens of the new estate
To which the
continental shelves aspire;
Or the powerful get
of a dying age, corrupt
And passion-smeared,
with fluid on their lips,
As if a soul had been
given to petroleum?
How shall we uncreate
that lawless energy?
Now I wait under the
hemlock by the Road
For the red-haired
postman with the smiling hand
To bring me my
passport to the war.
Familiarly his car
shifts into gear
Around the curve; he
coasts up to my drive; the day
Strikes noon; I think
of Pavlov and his dogs
And the motto carved
on the broad lintel of his brain:
“Sequence,
consequence, and again consequence.”
Caixa Postal de Havlik
(Sam Sidders: pintor
norte-americano)
Considerações junto a uma caixa de
correio
Quando eu me coloco
no centro da loucura daquele homem,
Profundamente em seu
trauma, como no fosso de uma chaga,
Meus ancestrais
afastam-se de meus ossos Americanos.
Lá está minha mãe num
xale trançado, e lá,
Sem dúvida, meu pai
apanhando o seu fardo
Para a viagem de
volta através daqueles terríveis anos
Rumo ao inverno do
olhar em cólera.
Nossa geração se foi,
há dois dias por avião,
Minha casa esbulhada,
meus amigos dispersos,
Meus dentes e orgulho
golpeados, meu povo joguete
Dos caçadores da
humana pele nas pocilgas da Europa,
As incríveis
criaturas de um histérico sonho
Avançando com
machadinhas enterradas em seus crânios
Para arrancarem o
deus às máquinas.
Serão estes os
cidadãos do novo estado
Ao qual os escolhos
do continente aspiram;
Ou a poderosa
linhagem de uma geração à morte, corrupta
e untada de flama,
com fluido em seus lábios,
como se houvesse sido
uma alma entregue ao petróleo?
Como iremos nós não
criar esta energia ilegítima?
Agora espero sob a
cicuta à beira da estrada
Pelo carteiro ruivo
com a sorridente mão
Que me irá trazer o
passaporte para a guerra.
Com familiaridade seu
carro muda a marcha
Na altura da curva; ele
encosta no passeio ao meu lado; o dia
Faz soar a sua
metade; penso em Pavlov e nos seus cães
E na inscrição
gravada na ampla moldura do seu cérebro:
“Sequência,
consequência, e uma outra vez consequência.”
Referências:
Em Inglês
KUNITZ, Stanley. Reflection by a
Mailbox. Disponível neste endereço. Acesso em:
28.3.2019.
Em Português
KUNITZ, Stanley. Considerações junto a
uma caixa de correio. Tradução de Zulmira Ribeiro Tavares. In: GUINSBURG, J.;
TAVARES, Zulmira Ribeiro (Orgs.). Quatro
mil anos de poesia. Desenhos de Paulina Rabinovich. São Paulo, SP:
Perspectiva, 1960. p. 226-227. (Coleção “Judaica”; v. 12)
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