Dedicado ao filósofo, pedagogo e escritor Martin Buber, austríaco de
origem judaica que, depois, naturalizou-se israelense, o poeta Armindo Trevisan
– também teólogo e ensaísta –, remonta graciosamente aos enredos bíblicos, para
de lá extrair os novos sentidos que passaram a moldar a terra de Israel – e mais
ainda, a própria existência da voz lírica, que se diz enredada aos fios
divinos.
Aparece o ceticismo sobre a revelação das intenções divinas aos homens
daquela terra – Deus falou? Mas quem o ouviu? –, e a mutação, nos dias
presentes, da natureza de Deus – teu Deus é outro –, embora ainda fiel. Qual
será então esse Deus? Terá se revestido, novamente, em ouro como o bezerro de outrora?
J.A.R. – H.C.
Armindo Trevisan
(n. 1933)
Israel
(À memória de Martin Buber)
Piso em silêncio as
pedras de Israel,
e nelas ouço, como em
búzios velhos,
as trombetas, os
gritos e os conselhos
que os profetas
soltaram pelos ares.
Sou de uma argila
antiga, sou fiel
a tantos fios que
vieram de teares
por onde andou a mão
de Deus. E sonho
que em outro sonho um
anjo apareceu,
e disse-me a palavra
que ecoou
no Monte em que, da
Nuvem, Deus falou.
Falou? Mas quem O
ouviu? Depois, submisso,
escuto novamente a
voz bravia
que não se acorrentou
à espada fria,
nem ao mel que o leão
moldou na boca,
Oh, eu piso, e
pisarei teu chão, Israel!
Mas viverei sonhando
anjos risonhos
Que voltarão nos meus
piores sonhos,
e me dirão: teu Deus
é outro – e fiel.
Em: “Os Olhos da Noite” (1997)
Moisés e os mensageiros de Canaã
(Giovanni Lanfranco:
pintor italiano)
Referência:
TREVISAN, Armindo. Israel. In:
__________. Nova antologia poética:
1967-2001. Porto Alegre, RS: Sulina, 2001. p. 180.
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