Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

Raymond Carver - A Teia de Aranha

Quando percebemos conscientemente que estamos presos ao passado – e as teias de aranha metaforizam, juntamente com o mofo, tudo aquilo que acumulamos e de que não nos desapegamos –, somos capazes de valorizar o tempo que ainda nos resta para viver, fazendo-nos abandonar o cenário das águas pretéritas e navegar por mares nunca dantes singrados.

É a precariedade da vida que assombra o espírito do poeta: parece-me que Carver, ao afirmar que, “em pouco tempo, antes que alguém se dê conta, terei partido daqui”, estivesse vislumbrando a morte e, não exatamente, a simples mudança de residência. Veja o leitor, ademais, que o poeta afirma ter incorrido num estado de reflexão sobre tudo o que lhe aconteceu até o momento presente...

J.A.R. – H.C.

Raymond Carver
(1938-1988)

The Cobweb

A few minutes ago, I stepped onto the deck
of the house. From there I could see and hear the water,
and everything that’s happened to me all these years.
It was hot and still. The tide was out.
No birds sang. As I leaned against the railing
a cobweb touched my forehead.
It caught in my hair. No one can blame me that I turned
and went inside. There was no wind. The sea was
dead calm. I hung the cobweb from the lampshade.
Where I watch it shudder now and then when my breath
touches it. A fine thread. Intricate.
Before long, before anyone realizes,
I’ll be gone from here.

Teia de Aranha
(Doris Jung-Rosu: pintora alemã)

A Teia de Aranha

Há alguns minutos, caminhei em direção ao terraço
da casa, de lá podia ver e ouvir a água,
e tudo que o aconteceu comigo durante todos esses anos.
Fazia calor em meio à quietude. A maré estava baixa.
Não cantavam os pássaros. Quando me apoiei no corrimão,
uma teia de aranha tocou-me a fronte.
E enredou-se no meu cabelo. Ninguém há de me censurar
por ter dado meia volta e entrado. Não ventava. O mar estava
calmo e sem vida. Fiz a teia de aranha pender do abajur.
Onde a vejo fremir vez por outra quando
minha respiração a toca. Um débil filamento. Intricado.
Em pouco tempo, antes que alguém se dê conta,
terei partido daqui.

Referência:

CARVER, Raymond. The cobweb. In: MILOSZ, Czeslaw (Ed.). A book of luminous things: an international anthology of poetry. 1st. ed. New York, NY: Houghton Mifflin Harcourt, 1998. p. 265.

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