A vida é como uma centelha: instável, lépida e contingente. E a sua
dinâmica compõe um evoluir ritmado com o encadeamento da morte. É a lição da
morte que arremata o ciclo completo da vida, extremo onde deveremos todos finar.
Tal é a mensagem de amarga ironia que Sponde procura levar até o leitor.
Nota-se no poema um interessante antagonismo, comum entre os poetas
barrocos, consistente em tornar implícito ou abrumado o desejo de viver, a
aspiração ao deleite dos sentidos, enquanto a inevitabilidade da morte é o que
se mostra em primeiro plano, contundente e pronunciada.
J.A.R. – H.C.
Jean de Sponde
(1557-1595)
Mais si faut-il mourir...
Mais si faut-il
mourir, et la vie orgueilleuse,
Qui brave de la mort,
sentira ses fureurs;
Les Soleils hâleront
ces journalières fleurs,
Et le temps crèvera
cette ampoule venteuse.
Ce beau flambeau qui
lance une flamme fumeuse,
Sur le vert de la
cire éteindra ses ardeurs;
L’huile de ce Tableau
ternira ses couleurs,
Et les flots se
rompront à la rive écumeuse.
J’ai vu ces clairs
éclairs passer devant mes yeux,
Et le tonnerre encor
qui gronde dans les Cieux,
Où d’une ou d’autre
part éclatera l’orage,
J’ai vu fondre la
neige et ses torrents tarir,
Ces lions rugissants
je les ai vu sans rage:
Vivez, hommes, vivez,
mais si faut-il mourir.
A Balsa da Medusa
(Théodore Géricault: pintor francês)
Mas todos vão morrer...
Mas todos vão morrer,
e esta vida orgulhosa,
Que insulta a morte,
vai sentir os seus furores;
Os sóis hão de
queimar as efêmeras flores,
E o tempo romperá
esta ampola vaidosa.
E a tocha que difunde
uma chama fumosa,
Na cera apagará do
pavio os ardores;
O óleo deste painel
perderá suas cores,
E a onda se quebrará
junto à praia espumosa.
Dos relâmpagos vi
fuzilar o clarão,
E a trovoada que ruge
ainda na amplidão,
Onde rebentará, perto
ou longe, a tormenta.
A neve que se esfaz,
vi deixar de correr
E vi mais de um leão,
que agora se apascenta:
Vivei, homens, vivei,
mas todos vão morrer.
Referência:
SPONDE, Jean de. Mais si faut-il
mourir... / Mas todos vão morrer... Tradução de Cláudio Veiga. In: VEIGA,
Cláudio (Organização e Tradução). Antologia
da poesia francesa: do século IX ao século XX. Edição bilíngue. Rio de
Janeiro, RJ: Record, 1991. Em francês: p. 98; em português: p. 99.
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