Sete são os dias da semana, e, num ritmo de trabalho carregado de
monotonia, o poeta os encerra com um interessante jogo semântico, empregando
ambivalentemente as palavras princípio e fim para denotar quer os seus
significados imediatos – início e término –, quer mediatos – premissa e
propósito.
À vista do fato de que, nos dias que correm, o sábado e o domingo, não
são dias úteis de efetivo trabalho, o poema pode ser associado a um padrão de labuta
similar ao do modo de produção industrial – magnificamente representado por
Chaplin em “Tempos Modernos”, de 1936 –, no qual o prazer maior, para os
operários, está na chegada da sexta-feira, já antevendo um momento de relaxo nos
dois dias do final de semana.
J.A.R. – H.C.
Geir Campos
(1924-1999)
Cantiga do ajustador
Não há de ser pesado
o ofício, talvez um tanto
monótono
– ao todo sete
parafusos para se parafusar.
Só no segundo
parafuso a gente parece notar
que o trabalho há de
ser
monótono
monótono;
e no terceiro
parafuso a notação é certa no ar
de que algo vai ser
monótono
monótono
monótono;
o quarto parafuso
então já é mais difícil de pegar
e os dedos vagam pelo
tédio e não pousam no lugar,
o médio e o indicador
não dobram, não enverga o polegar,
como se fosse um
exercício extraordinário e não vulgar
de tão monótono
monótono
monótono
monótono;
a tempo o quinto
parafuso vem puxando devagar
outra metade do
serviço com promessa de acabar;
e ao vir o sexto
parafuso, o penúltimo que virá,
isto já não é tão
monótono
e quase nem é
monótono;
enfim o sétimo,
apesar de ainda
monótono,
é o do fim...
E quando o fim é bom
é sempre um bom
princípio
para mim.
Regressando da fábrica
(Laurence Stephen
Lowry: pintor inglês)
Referência:
CAMPOS, Geir. Cantiga do ajustador. In:
__________. Tarefa. Rio de Janeiro,
RJ: Civilização Brasileira; São Paulo, SP: Massao Ohno; Brasília, DF: INL,
1981. p. 48.
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