Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

domingo, 3 de fevereiro de 2019

Vivek Narayanan - Ode à prosa

Porque nem sempre a lírica é capaz de atingir as maiores alturas, o escritor-poeta lança mão da prosa, ela que emerge de toda e qualquer forma de experiência humana, não só das sublimes, senão também daquelas comezinhas, a se aproximarem do solo desorganizado do quotidiano, no qual se distribuem, no mesmo espaço, manifestações de modernidade e de tardança.

As palavras de Narayanan põem de manifesto imagens extraídas, decerto, à sua Índia natal, onde os elefantes exercem tarefas para as quais as mãos humanas não se mostram hábeis, ou melhor, não disporiam de tanta força para executá-las, em meio à contemporaneidade das ceifeiras-debulhadoras e do emprego da robótica na construção civil.

J.A.R. – H.C.

Vivek Narayanan
(n. 1972)

Ode to prose

(for Ratika)

For we long for the vertical reach of verse,
its first-dipping rise into the blue,
its way of fixing the stars in their firmament –

for we are at home in the world sometimes –

...but on other days the dark pebbly-smooth noun-stones in a well
of prose will do;
prose straining towards the spirit of prose,
prose that rarely walks unplanted, scythe among the stalks,
prose that in the rainbow-arching reach of the line rolls into plain view,
like a hippo, like a tank, like a combine-harvester drawing
steadily across;
that prose is the mat we slept on,
the only heart we can trust if only because it beat so firmly,
that prose is black bread, the grain we power our machines with,
that prose is not averse to philosophy,
that it pulls back from sophistry

...that one day among the robotic contractors and their forklifts,
the elephants devoted to their granite blocks and their mahout,
the tracts of arable land as seen from the sentinel’s smug cabin,
near the marketplace, bursting with spoiled tomatoes, tasty slabs of meat –

among all this, or in the stable near the pigs,
in the hour of the blood sacrifice,
at the moment of that offering,
humble, hewn from a human hand –

that quadrangular prose, at that very moment, be born.

Cidade
(Aleksandra Ekster: pintora franco-russa)

Ode à prosa

Porque aspiramos pelo alcance vertical do verso,
seu primeiro mergulho eleva-se até o azul,
à guisa de fixar as estrelas em seu firmamento –

pois às vezes estamos em casa no mundo –

...porém em outros dias, bastarão as escuras pedras-substantivos como
seixos lisos em um poço de prosa;
prosa esforçando-se até o espírito da prosa;
prosa que raramente caminha sem plantas arrancadas, segadeira entre talos,
prosa que em toda a extensão da linha curva do arco-íris converte-se numa
vista plana, como um hipopótamo, como um tanque, como uma
ceifeira-debulhadora movendo-se uniformemente de lado a lado;
essa prosa é a esteira sobre a qual dormimos,
o único coração em que podemos confiar, ainda que somente seja porque
bate com tanta força;
essa prosa é pão negro, o grão com que alimentamos nossas máquinas,
prosa não avessa à filosofia,
a bem se distanciar da sofística

...tanto que, nalgum dia, entre esses contratistas robóticos e suas empilhadeiras,
os elefantes dedicados aos seus blocos de granito e cornacas,
às extensões de terra arável vistas a partir da presumida guarita do sentinela,
perto do mercado, repleto de tomates estropiados e saborosos nacos de carne –

no meio de tudo isso, ou no estábulo próximo aos porcos,
na hora do sacrifício sangrento,
no momento dessa oferenda,
modesta, lavrada por mão humana,

essa prosa quadrangular, nesse mesmo ensejo, logra nascer.

Referência:

NARAYANAN, Vivek. Ode to prose. In: THAYIL, Jeet (Ed.). 60 indian poets. New Delhi, IN: Penguin Books India, 2008. p. 89.

Nenhum comentário:

Postar um comentário