Porque nem sempre a lírica é capaz de atingir as maiores alturas, o
escritor-poeta lança mão da prosa, ela que emerge de toda e qualquer forma de
experiência humana, não só das sublimes, senão também daquelas comezinhas, a se
aproximarem do solo desorganizado do quotidiano, no qual se distribuem, no
mesmo espaço, manifestações de modernidade e de tardança.
As palavras de Narayanan põem de manifesto imagens extraídas, decerto, à
sua Índia natal, onde os elefantes exercem tarefas para as quais as mãos humanas
não se mostram hábeis, ou melhor, não disporiam de tanta força para
executá-las, em meio à contemporaneidade das ceifeiras-debulhadoras e do
emprego da robótica na construção civil.
J.A.R. – H.C.
Vivek Narayanan
(n. 1972)
Ode to prose
(for Ratika)
For we long for the
vertical reach of verse,
its first-dipping
rise into the blue,
its way of fixing the
stars in their firmament –
for we are at home in
the world sometimes –
...but on other days
the dark pebbly-smooth noun-stones in a well
of prose will do;
prose straining
towards the spirit of prose,
prose that rarely
walks unplanted, scythe among the stalks,
prose that in the
rainbow-arching reach of the line rolls into plain view,
like a hippo, like a tank, like a combine-harvester drawing
steadily across;
that prose is the mat
we slept on,
the only heart we can
trust if only because it beat so firmly,
that prose is black
bread, the grain we power our machines with,
that prose is not
averse to philosophy,
that it pulls back
from sophistry
...that one day among
the robotic contractors and their forklifts,
the elephants devoted
to their granite blocks and their mahout,
the tracts of arable
land as seen from the sentinel’s smug cabin,
near the marketplace,
bursting with spoiled tomatoes, tasty slabs of meat –
among all this, or in
the stable near the pigs,
in the hour of the
blood sacrifice,
at the moment of that
offering,
humble, hewn from a
human hand –
that quadrangular
prose, at that very moment, be born.
Cidade
(Aleksandra Ekster: pintora
franco-russa)
Ode à prosa
Porque aspiramos pelo
alcance vertical do verso,
seu primeiro mergulho
eleva-se até o azul,
à guisa de fixar as
estrelas em seu firmamento –
pois às vezes estamos
em casa no mundo –
...porém em outros
dias, bastarão as escuras pedras-substantivos como
seixos lisos em um
poço de prosa;
prosa esforçando-se
até o espírito da prosa;
prosa que raramente
caminha sem plantas arrancadas, segadeira entre talos,
prosa que em toda a
extensão da linha curva do arco-íris converte-se numa
vista plana, como um
hipopótamo, como um tanque, como uma
ceifeira-debulhadora
movendo-se uniformemente de lado a lado;
essa prosa é a
esteira sobre a qual dormimos,
o único coração em
que podemos confiar, ainda que somente seja porque
bate com tanta força;
essa prosa é pão
negro, o grão com que alimentamos nossas máquinas,
prosa não avessa à
filosofia,
a bem se distanciar
da sofística
...tanto que, nalgum
dia, entre esses contratistas robóticos e suas empilhadeiras,
os elefantes
dedicados aos seus blocos de granito e cornacas,
às extensões de terra
arável vistas a partir da presumida guarita do sentinela,
perto do mercado,
repleto de tomates estropiados e saborosos nacos de carne –
no meio de tudo isso,
ou no estábulo próximo aos porcos,
na hora do sacrifício
sangrento,
no momento dessa
oferenda,
modesta, lavrada por
mão humana,
essa prosa
quadrangular, nesse mesmo ensejo, logra nascer.
Referência:
NARAYANAN, Vivek. Ode to prose. In:
THAYIL, Jeet (Ed.). 60 indian poets.
New Delhi, IN: Penguin Books India, 2008. p. 89.
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