Alpes Literários

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UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

Philip Larkin - Ausências

Até que se conheça o derradeiro verso deste poema de Larkin, tudo se passa como se o poeta inglês estivesse descrevendo algum cenário litorâneo da ilha britânica, sem ir muito além do plano local, quanto ao sentido que, então, se poderia atribuir à mensagem nele encerrada.

Contudo, no fecho do poema, Larkin expõe-se para veicular um significado com conteúdo mais aberto – pungente e universal –, sobre a natureza da condição humana: há suficiente alegria em libertar-se não só do potencial alheamento de nossas blindagens autoimpostas, como também das obsessões e balizas quotidianas, que nos são compelidas por uma visão por demais empírica do mundo.

As componentes simbólicas do verso fazem-no fluir em saltos: passa-se do mar às águas-furtadas e destas à própria ausência, tal que, ao final, fica-nos a sensação de transcendência que o poeta quer-nos transmitir, muito além das circunscrições meramente familiares ou reservadas.

J.A.R. – H.C.

Comentário de Philip Larkin sobre “Ausências”

Suponho que goste de “Ausências” (a) em razão de seu tema – sempre me entusiasmo com a ideia de como os lugares parecem quando lá não estou; (b) porque imagino que faz soar como se fosse um poeta diferente, melhor do que efetivamente sou. O derradeiro período, por exemplo, soa como uma tradução ligeiramente inconsistente de um simbolista francês; gostaria de poder escrever assim mais amiúde.

Incidentalmente, um oceanógrafo me escreveu assinalando que eu estava confundindo dois tipos de ondas – ondas de mergulho ou tubulares e ondas de derramamento ou deslizantes –, o que teria provocado danos ao poema sob o ponto de vista técnico. Sinto-o muito, porém não vejo como emendá-lo agora. (ENGLE; LANGLAND, 1962, p. 202-203)

Philip Larkin
(1922-1985)

Absences

Rain patters on a sea that tilts and sighs.
Fast-running floors, collapsing into hollows,
Tower suddenly, spray-haired. Contrariwise,
A wave drops like a wall: another follows,
Wilting and scrambling, tirelessly at play
Where there are no ships and no shallows.

Above the sea, the yet more shoreless day,
Riddled by wind, trails lit-up galleries:
They shift to giant ribbing, sift away.

Such attics cleared of me! Such absences!

Ouro Líquido
(Wade Koniakowsky: pintor norte-americano)

Ausências

A chuva salpica um mar que se inclina e suspira.
Planos intensamente velozes, colapsando em depressões,
Sobem de repente, aspergindo crinas de espuma.
    Em sentido oposto,
Uma onda desmorona qual um muro: outra a segue,
Perdendo força e a resvalar, numa pugna infatigável
Onde não há batéis nem bancos de areia.

Por cima do mar, o dia mais ilimitado ainda,
Penetrado pelo vento, vagueia por galerias iluminadas:
Convertidas em imensas nervuras, elas se afastam.

Esses áticos de mim liberados! Essas ausências!

Referência:

LARKIN, Philip. Absences. In: ENGLE, Paul; LANGLAND, Joseph (Eds.). Poet’s choice. New York, NY: The Dial Press, 1962. p. 202.

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