Bem próximo à virada do ano, temos o costume de nos desfazer de coisas
que já não fazem mais sentido para nós: papéis velhos, roupas por demais (ou
jamais) usadas, coisas que, de uma forma ou de outra, entulham os nossos lares
e que poderiam ser mais bem aproveitadas por outras pessoas.
E de um ano que se adjetiva como passado, Clare nos alerta para o fato
de que é tempo que não volta mais, para ser novamente experimentado, muito
embora os seus efeitos sejam palpáveis no ambiente à volta, haja vista que
temos meios para constatar as mudanças provocadas em nossas vidas – quer
sobre o que nos pertence quer sobre nossos corpos.
J.A.R. – H.C.
John Clare
(1793-1864)
Retrato de William
Hilton
The Old Year
The Old Year’s gone
away
To nothingness and
night:
We cannot find him
all the day
Nor hear him in the
night:
He left no footstep,
mark or place
In either shade or
sun:
The last year he’d a
neighbour’s face,
In this he’s known by
none.
All nothing
everywhere:
Mists we on mornings
see
Have more of
substance when they’re here
And more of form than
he.
He was a friend by
every fire,
In every cot and hall
–
A guest to every
heart’s desire,
And now he’s nought
at all.
Old papers thrown
away,
Old garments cast
aside,
The talk of
yesterday,
Are things
identified;
But time once torn
away
No voices can recall:
The eve of New Year’s
Day
Left the Old Year
lost to all.
(1845)
Lareira de Natal
(John Sloane: pintor
norte-americano)
O Ano Velho
O Ano Velho dispersou-se
Nas trevas e na não existência:
Não deparamos com ele
todo o dia,
Tampouco o escutamos
à noite:
Não deixou rastro,
marca ou lugar
Nalgum sol ou
penumbra:
O ano findo tinha a
cara de um vizinho,
Motivo por que
ninguém o conhece.
Nada há de seu em parte
alguma:
As brumas que vemos
nas manhãs
Exibem mais
substância quando aqui estão
E mais forma do que
ele.
Era companhia à volta
de cada lareira,
Em qualquer choupana
ou salão –
Um hóspede de todo
desejo do coração,
E agora não é nada em
absoluto.
Papéis velhos jogados
fora,
Roupas gastas
deixadas de lado,
A conversa de ontem,
São coisas passíveis
de comprovar;
Porém do tempo, uma
vez arrebatado,
Não há vozes capazes
de recordar:
A véspera do Dia de Ano
Novo
Fez do Ano Velho uma
perda para todos.
(1845)
Referência:
CLARE, John. The old year. In:
__________. Poems: chiefly from
manuscript. London, EN: Richard Cobden-Sanderson, 1920. p. 202.
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