Aqui se fala daquelas pessoas que têm experiências de viver na casa dos
outros, talvez de familiares distantes ou nem tanto, com limitado sentido de
pertencimento ao grupo: os de meia-idade são capazes de fornecer abrigo às
crianças ou aos adolescentes, mas não a necessária sabedoria de vida.
Não há sentido em reprimir ou ignorar a ocorrência de fatos ou de
eventos que espicaçaram a memória: são ementas psíquicas dificilmente deslindadas
e muito menos suprimidas. Quando adultos, o melhor é se chegar a um acordo com
o passado e descobrir quantas foram as trincas suturadas e quantas deixadas abertas,
sem expressão e não reconhecidas. Desse modo, “vinte anos” não se contarão
apenas como uma sucessão de “silêncios”, muito provavelmente excruciantes,
agônicos, tormentosos...
J.A.R. – H.C.
Adrienne Rich
(1929-2012)
The Middle-Aged
Their faces, safe as
an interior
Of Holland tiles and
Oriental carpet,
Where the fruit-bowl,
always filled, stood in a light
Of placid afternoon ⎯ their voices’ measure,
Their figures moving
in the Sunday garden
To lay the tea
outdoors or trim the borders,
Afflicted, haunted
us. For to be young
Was always to live in
other peoples’ houses
Whose peace, if we
sought it, had been made by others,
Was ours at
second-hand and not for long.
The custom of the
house, not ours, the sun
Fading the
silver-blue Fortuny curtains,
The reminiscence of a
Christmas party
Of fourteen years ago
⎯
all memory.
Signs of possession
and of being possessed,
We tasted, tense with
envy. They were so kind,
Would have given us
anything; the bowl of fruit
Was filled for us,
there was a room upstairs
We must call ours:
but twenty years of living
They could not give.
Nor did they ever speak
Of the coarse stain
on that polished balustrade,
The crack in the
study window, or the letters
Locked in a drawer
and the key destroyed.
All to be understood
by us, returning
Late, in our own time
⎯
how that peace was made,
Upon what terms, with
how much left unsaid.
Lado a Lado
(Dianne Dengel:
pintora norte-americana)
A Meia Idade
Seus rostos, seguros
como um interior
De azulejos
holandeses e um tapete oriental,
No qual a fruteira,
sempre abastada, mantinha-se
À luz plácida da
tarde – a mesura de suas vozes,
Seus vultos no jardim
dominical, ocupados
Em servir o chá ao ar
livre ou em podar as plantas,
Sob angústia, nos assombravam.
Porque ser jovem
Era sempre viver nas
casas de outras pessoas,
Cuja paz, caso a
perscrutássemos, fora por elas urdida,
sendo nossa de
segunda-mão e não por muito tempo.
As tradições da casa,
não as nossas, o sol
A empalidecer o
azul-prateado das cortinas “Fortuny”,
A reminiscência das
comemorações do Natal
De quatorze anos
atrás – tudo são memórias.
Sinais de posse e de
ser possuídos,
Nós os vivenciamos,
tensos de inveja. Eram tão gentis,
Ter-nos-iam dado
qualquer coisa; a fruteira sempre
Farta para nós; havia
um quarto no andar de cima
Que devíamos ter como
nosso: mas vinte anos de vida
Eles não nos poderiam legar. Jamais se referiram
À áspera mancha sobre
aquela balaustrada polida,
Ao trincado na janela
do escritório, ou às cartas
Encerradas numa
gaveta da qual a chave se quebrara.
Tudo para que percebêssemos,
ao retornarmos tarde,
Em nosso próprio
tempo – como aquela paz foi gestada,
Em que termos, com quanto
do muito que não foi dito.
Referência:
RICH, Adrienne. The middle-aged. In:
LEHMAN, David (Choice & Edition). The
Oxford Book of American Poetry. New York, NY: Oxford University Press,
2006. p. 868.
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