Alpes Literários

Alpes Literários

Subtítulo

UM PASSEIO PELOS ALPES LITERÁRIOS

sábado, 8 de dezembro de 2018

Adrienne Rich - A Meia Idade

Aqui se fala daquelas pessoas que têm experiências de viver na casa dos outros, talvez de familiares distantes ou nem tanto, com limitado sentido de pertencimento ao grupo: os de meia-idade são capazes de fornecer abrigo às crianças ou aos adolescentes, mas não a necessária sabedoria de vida.

Não há sentido em reprimir ou ignorar a ocorrência de fatos ou de eventos que espicaçaram a memória: são ementas psíquicas dificilmente deslindadas e muito menos suprimidas. Quando adultos, o melhor é se chegar a um acordo com o passado e descobrir quantas foram as trincas suturadas e quantas deixadas abertas, sem expressão e não reconhecidas. Desse modo, “vinte anos” não se contarão apenas como uma sucessão de “silêncios”, muito provavelmente excruciantes, agônicos, tormentosos...

J.A.R. – H.C.

Adrienne Rich
(1929-2012)

The Middle-Aged

Their faces, safe as an interior
Of Holland tiles and Oriental carpet,
Where the fruit-bowl, always filled, stood in a light
Of placid afternoon their voices’ measure,
Their figures moving in the Sunday garden
To lay the tea outdoors or trim the borders,
Afflicted, haunted us. For to be young
Was always to live in other peoples’ houses
Whose peace, if we sought it, had been made by others,
Was ours at second-hand and not for long.
The custom of the house, not ours, the sun
Fading the silver-blue Fortuny curtains,
The reminiscence of a Christmas party
Of fourteen years ago all memory.
Signs of possession and of being possessed,
We tasted, tense with envy. They were so kind,
Would have given us anything; the bowl of fruit
Was filled for us, there was a room upstairs
We must call ours: but twenty years of living
They could not give. Nor did they ever speak
Of the coarse stain on that polished balustrade,
The crack in the study window, or the letters
Locked in a drawer and the key destroyed.
All to be understood by us, returning
Late, in our own time how that peace was made,
Upon what terms, with how much left unsaid.

Lado a Lado
(Dianne Dengel: pintora norte-americana)

A Meia Idade

Seus rostos, seguros como um interior
De azulejos holandeses e um tapete oriental,
No qual a fruteira, sempre abastada, mantinha-se
À luz plácida da tarde – a mesura de suas vozes,
Seus vultos no jardim dominical, ocupados
Em servir o chá ao ar livre ou em podar as plantas,
Sob angústia, nos assombravam. Porque ser jovem
Era sempre viver nas casas de outras pessoas,
Cuja paz, caso a perscrutássemos, fora por elas urdida,
sendo nossa de segunda-mão e não por muito tempo.
As tradições da casa, não as nossas, o sol
A empalidecer o azul-prateado das cortinas “Fortuny”,
A reminiscência das comemorações do Natal
De quatorze anos atrás – tudo são memórias.
Sinais de posse e de ser possuídos,
Nós os vivenciamos, tensos de inveja. Eram tão gentis,
Ter-nos-iam dado qualquer coisa; a fruteira sempre
Farta para nós; havia um quarto no andar de cima
Que devíamos ter como nosso: mas vinte anos de vida
Eles não nos poderiam legar. Jamais se referiram
À áspera mancha sobre aquela balaustrada polida,
Ao trincado na janela do escritório, ou às cartas
Encerradas numa gaveta da qual a chave se quebrara.
Tudo para que percebêssemos, ao retornarmos tarde,
Em nosso próprio tempo – como aquela paz foi gestada,
Em que termos, com quanto do muito que não foi dito.

Referência:

RICH, Adrienne. The middle-aged. In: LEHMAN, David (Choice & Edition). The Oxford Book of American Poetry. New York, NY: Oxford University Press, 2006. p. 868.

Nenhum comentário:

Postar um comentário