A fazer “tabula rasa” dos humanos, seus pares – ou de alguém em
específico, talvez ela própria –, a sóror mexicano-espanhola recorre à tese de
que os sentidos de que dispomos nos levam a erros e, miséria de todas as
misérias, a existência humana é um nada, a despeito da experiência que tenhamos
tido na vida, ou ainda, mesmo que povoada pelo colorido das artes.
Afinal, aos seus olhos, a arte mente, engana astutamente por intermédio
de “falsos silogismos de cores”. E mais do que isso: ao conectar a falsidade da
obra de arte – aparentemente um retrato pintado em tela –, ao tema da
mortalidade, Inés acaba por denunciar o engano do que se postula ser a verdade.
J.A.R. – H.C.
Sor Juana Inés de la Cruz
(1648-1695)
Retrato de Juan de
Miranda
Este que ves, engaño colorido
Este que ves, engaño
colorido,
que, del arte
ostentando los primores,
con falsos silogismos
de colores
es cauteloso engaño
del sentido;
éste, en quien la
lisonja ha pretendido
excusar de los años
los horrores,
y venciendo del
tiempo los rigores
triunfar de la vejez
y del olvido,
es un vano artificio
del cuidado,
es una flor al viento
delicada,
es un resguardo
inútil para el hado:
es una necia
diligencia errada,
es un afán caduco y,
bien mirado,
es cadáver, es polvo,
es sombra, es nada.
O grito nº 3
(Oswaldo Guayasamin:
pintor equatoriano)
Este, que vês, engano colorido
Este, que vês, engano
colorido,
que, ostentando das
artes os primores,
com silogismos
pérfidos de cores
é cauteloso engano
dos sentidos;
este, em quem a
lisonja pretendido
tem escusar dos anos
os horrores,
e, ao tempo
subjugando-lhe os rigores,
triunfar sobre a
velhice e sobre o olvido,
é vazio artifício do
cuidado,
é flor exposta ao
vento, delicada,
é inútil resguardo
contra o fado:
é apenas néscia
diligência errada,
afã caduco, e, bem
considerado,
é cadáver, é pó, é
sombra, é nada.
Referência:
DE LA CRUZ, Sor Juana Inés. Este que
ves, engaño colorido / Este, que vês, engano colorido. Tradução de Anderson
Braga Horta. In: ÉGÜEZ, Gustavo Pavel (Org.). Antologia poética ibero-americana. Edição bilíngue espanhol x
português. Traduções de Fernando Mendes Vianna; José Jeronymo Rivera e Anderson
Braga Horta. Cuiabá, MT: Associación de Agregados Culturales Iberoamericanos,
2006. Em espanhol: p. 167; em português: p. 168.
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